Três anos após o golpe de Estado, a junta militar de Mianmar parece mais enfraquecida do que nunca, depois de uma vasta ofensiva — no final de outubro de 2023 — realizada por grupos armados. O movimento de resistência é composto por uma multiplicidade de grupos étnicos armados e pelo PDF, as forças de defesa populares, um braço armado formado pelo governo de unidade nacional no exílio, em resposta ao golpe. Enquanto isso, a vencedora do prêmio Nobel da Paz, Aung San Suu Kyi, permanece na prisão.
A oposição reafirmou sua ambição num texto publicado na quarta-feira (31/01), de derrubar o regime militar birmanês e avançar para uma nova união democrática e federal. Dessa maneira, o NUG, movimento de oposição no exílio, descreve o seu objetivo político. Os opositores querem que Mianmar seja um país igualitário.
Para isso estabeleceram, pela primeira vez, um rumo preciso que se baseia em seis pontos: que as forças armadas deixem de se envolver na política, que os militares sejam colocados sob o controle de um governo civil democraticamente eleito com uma nova Constituição e o estabelecimento de um estado federal.
O texto também prevê o que chama de mecanismo de justiça transicional. Em outras palavras, o NUG pretende, em última análise, curar as feridas da sociedade birmanesa, nomear os responsáveis e reparar o que puder ser reparado para colocar o país novamente no caminho certo para o futuro.
Mantenha o poder
Mas atualmente, a junta não tem a intenção de desistir do poder e o NUG sabe disso. O texto tem valor de profecia e encorajamento e os três anos do golpe de Estado coincidem com um avanço progressivo de grupos rebeldes em diversas regiões. A leste, no estado de Shan, perto da fronteira chinesa, eles recuperaram o controle de uma grande área perdida há 15 anos e expulsaram milhares de soldados que entregaram as armas.
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Três anos após golpe de Estado, junta militar de Mianmar parece mais enfraquecida do que nunca
A oeste, em Arakan, tomaram a cidade estratégica de Paletwa, as estradas e os rios. Os rebeldes controlam tudo o que pode passar pela província por estrada ou por barco em direção à Índia e Bangladesh, que ficam a apenas alguns quilômetros de distância. Alguns dos grupos rebeldes birmaneses uniram-se e desde outubro já não se contentam em resistir à junta, passaram à ofensiva e os resultados são impressionantes.
Desmotivação
A questão agora é se estes grupos armados serão capazes de tirar do poder o regime de Mianmar. Militarmente, isto nunca aconteceu na história contemporânea do país.
Para Lway Mownt Noon, revolucionária, ex-presa política e militante feminista da minoria étnica Ta’ang, o maior problema das forças rebeldes vem do coração do país.
“As forças de defesa do povo, especialmente as lideradas pelo grupo étnico maioritário Bamar, não estão unidas. Eles não colaboram entre si, não se apoiam e não têm comandante”, disse à RFI.
Mownt Noon acredita que a libertação da ganhadora do prêmio Nobel da Paz, Aung San Sou Kyi, causaria mais problemas. “O problema são os Bamars e é Aung San Suu Kyi a responsável por este desequilíbrio entre os revolucionários. A sua libertação só criaria mais dificuldades tanto para os Bamars como para as comunidades étnicas”, diz.
“Para atingir os objetivos, acabar com a ditadura militar e construir uma união federal, o governo de unidade nacional deve estar no comando. Mas ele ainda não tem capacidade e isso é um problema. Todos os líderes das forças armadas de resistência estão dentro do país, o ministro da Defesa está no exterior”, diz.
Os soldados birmaneses estão desmotivados, mal equipados e mal supervisionados, mas até à data não houve grandes deserções. Os militares ainda contam com superioridade aérea: helicópteros e aviões de combate que lhes permitem resistir. Se os generais alguma vez capitularem — neste momento ainda não é uma possibilidade palpável — haverá outra batalha, a da criação de uma identidade nacional num país multiétnico, onde o poder não será fácil de compartilhar.