Extração de gás natural de depósitos de xisto por meio de fraturamento hidráulico, na Pensilvânia
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Na Pensilvânia — estado norte-americano situado no centro da bacia de xisto Marcellus —, os conceitos de “frackademia” e “frackadêmicos” ganharam popularidade.
No dia 27 setembro de 2012, a Câmara de Deputados do estado — numa votação de 136 a 62 — aprovou um projeto de lei que permite a realização do fraturamento hidráulico (fracking, em inglês) para o processo de extração de gás natural de depósitos de xisto (mediante o bombeamento de água e substâncias químicas no subsolo para quebrar as rochas), em campi de universidades públicas. Versão idêntica da lei para o Senado foi aprovada em junho numa votação de 46 a 3, enquanto o governador republicano Tom Corbett assinou a lei como o Ato 147 em 8 de outubro.
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O projeto de lei é chamado informalmente de Ato de Desenvolvimento dos Recursos Minerais Nativos. Ele teve o apoio do senador republicano Don White, um dos grandes destinatários do financiamento da indústria de petróleo e gás entre 2000 e abril de 2012, tendo recebido US$ 94 mil durante esse período, de acordo com relatório publicado pela associação civil apartidária Common Cause PA e pela organização ambiental Conservation Voters of Pennsylvania. Corbett já levou US$ 1,8 milhão da indústria de petróleo e gás desde quando trabalhava como procurador-geral do Estado, em 2004.
A administração de Corbett cortou os orçamentos da educação superior num total de US$ 460 milhões, somando a redução dos dois últimos orçamentos estatais consecutivos da Pensilvânia. A indústria de petróleo e gás ofereceu o fraturamento hidráulico como um novo meio para angariar fundos para as universidades com falta de dinheiro.
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Novos poços
Nem todos os professores estão entusiasmados com essa ideia.
“Eu fiquei extremamente preocupado, perturbado e enojado com as consequências ambientais do fraturamento hidráulico”, disse um professor da University Lock Haven à revista independente Mother Jones num artigo recente. “Eles causaram explosões, dezenas de milhares de produtos químicos derramados. E eles vão colocar isso no campus?”
Sydney Brownstone, da Mother Jones, também explicou que a Pensilvânia não é o único estado que está dentro do jogo, ao afirmar: “Duas faculdades na Virgínia Ocidental alugaram suas terras para empresas de fraturamento hidráulico, e Ohio possui uma lei similar à da Pensilvânia. A Universidade do Texas também arrecada dinheiro com poços de gás natural em suas terras, e chegou a instalar um a 120 metros de uma creche em seu campus de Arlington.
Entretanto, esses detalhes são a ponta do iceberg, já que, há alguns anos, atividades de fraturamento hidráulico ocorreram perto de escolas de ensino básico, com consequências devastadoras para a saúde.
A respeito dos fraturamentos hidráulicos realizados em áreas de instalações escolares, a indústria de gás não conhece limites geográficos quando decide extrair gás de xisto perto de escolas. Três estados servem como estudos de casos.
Nova York
Provavelmente a situação mais trágica pode ser encontrada em Le Roy, Nova York, uma cidade com cerca de 7.600 cidadãos, mais precisamente na escola de ensino médio Le Roy. A CNN denunciou o caso Le Roy em fevereiro de 2012. Há seis poços de gás natural em terrenos das escolas e dois deles registraram vazamentos, matando a vegetação em seu entorno. É nesse local que diariamente crianças e jovens brincam e praticam esportes.
Até março do ano passado, houve 18 casos documentados de Síndrome de Tourette, desodem neurológica caracterizada por tiques e espasmos repentinos.
Erin Brockovich, a advogada cuja luta foi retratada no filme que leva seu nome e famosa por ganhar uma ação coletiva de mais de US$ 300 milhões contra a empresa Pacific Gas and Electric, nos anos 1990, pela contaminação de água subterrânea com cromo hexavalente, também decidiu assumir o caso. “Nós não temos todas as respostas, mas temos as suspeitas”, ela contou ao USA Today. “A comunidade nos pediu para ajudar e é isso que iremos fazer.”
Texas
Em fevereiro de 2011, a empresa de gás de xisto propôs colocar vários poços a poucos quarteirões de uma escola localizada no Distrito Escolar Independente de Fort Worth (FWISD, na sigla em inglês). A Associação de Bairros de Fort Worth procedeu com uma contraproposta própria, exigindo que os poços ficassem a pelo menos um quilômetro e meio de escolas de ensino básico.
Estudos mostram “altos níveis de dissulfeto de carbono encontrados perto das três escolas do FWISD”, registrou uma reportagem feita pela CBS Dallas-Fort Worth, em fevereiro de 2011. “Dissulfeto de carbono é um líquido incolor e volátil associado a problemas respiratórios, gastrointestinais e cardiovasculares.”
Além disso, Argyle, no Texas, aprovou a abertura de 36 poços de fraturamento hidráulico, todos ficam bem no meio do terreno da escola primária, secundária e de ensino médio da minúscula cidade (população de 3.282). Ainda nesse estado, sondas de perfuração estão do outro lado da rua da escola de ensino médio Cotulla High School, em Cotulla, e três estão atrás da escola Selwyn, em Denton, bem próximo ao parque infantil.
Colorado
Num artigo em junho, o DeSmogBlog descreveu a cidade de Erie, no Colorado, como uma peça fundamental na luta contra o fraturamento hidráulico. A empresa EnCana Oil and Gas Corporation, conforme explicamos, planeja extrair gás de xisto perto de três escolas locais e de um centro de acolhimento de crianças: as escolas primárias Red Hawk e Erie, a escola secundária Erie e o centro de acolhimento Exploring Minds. A cidade recebeu a empresa de braços abertos.
Erie serve como estudo de caso para uma epidemia no Colorado. Um estudo conduzido pelo Western Resources Advocates, um grupo de defensores dos recursos naturais da região, encontrou quase 200 poços a 600 metros de uma escola pública.
Em contrapartida, explicou o grupo, “no Colorado, é ilegal deixar um veículo ocioso por mais de 5 minutos a 300 metros de uma escola — mas você pode perfurar para extrair petróleo e gás, espalhando químicas potencialmente tóxicas no ar, desde que não esteja a menos de 100 metros”.
Um estudo publicado em março pela University of Colorado School of Public Heath, a faculdade de saúde pública da universidade do estado, demonstra os graves riscos associados ao fato de uma pessoa passar a maior parte do tempo próxima das operações de fraturamento hidráulico, como explicado pelos Advocates.
Essas realidades, pelo menos até agora, não desaceleraram a corrida pelo gás nem serviram como alerta vermelho para o governo do Colorado não permitir esse tipo de atividade.
Defensores do fraturamento hidráulico continuam a empurrar imprudente e irresponsavelmente operações de fratura até mesmo frente a um esmagador corpo científico que demonstra que o método apresenta sérios riscos à saúde e ao meio ambiente. O consenso entre especialistas e agências governamentais é que precisamos de mais estudos científicos sobre o processo. Nossa água, nosso ar e nossa saúde não têm preço.
Dada a situação na indústria de gás por todo o país, é difícil discordar.
Tradução por Jessica Grant
* Texto publicado originalmente no site DeSmogBlog
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