No programa 20MINUTOS ANÁLISE desta terça-feira (10/08), o jornalista e fundador de Opera Mundi, Breno Altman, discorreu sobre a atuação das Forças Armadas no atual cenário político do país.
A análise de Altman acontece diante da tensão provocada pelo desfile da Força de Fuzileiros da Esquadra, vinculada à Marinha, no mesmo dia em que a Câmara dos Deputados votou a PEC 135/19, acerca do voto impresso.
“Tanto a Marinha quanto autoridades civis vinculadas ao bolsonarismo alegam coincidência de datas. Mas não pode haver dúvidas que a ação em si coloca ainda com mais evidência a questão militar e a hipótese do chefe de Estado ter o autogolpe como uma carta na manga, com apoio das Forças Armadas”, defendeu o jornalista.
Segundo ele, para entender os acontecimentos em curso, é necessário compreender como “estrutural, ainda que contraditória” a relação entre o bolsonarismo e as Forças Armadas. Para Altman, se equivocam aqueles que a definem como fenômeno fortuito, tático e passageiro. “O desfile desta terça-feira é somente um episódio a colocar por terra essa abordagem que parece, aos meus olhos, de uma superficialidade gritante, talvez a serviço, para alguns, do objetivo de amenizar conflitos com os militares e buscar pontes que, mais uma vez, preservem sua histórica impunidade frente aos descalabros a que condenam, a cada tanto, o povo brasileiro”, afirmou.
O jornalista faz referência à obra O 18 Brumário de Louis Bonaparte, de Karl Marx, e ao conceito de bonapartismo, desenvolvido nesse livro. O termo se refere a cenários nos quais os velhos sistemas burgueses de dominação entram em crise e o Estado deixa de ser capaz de conduzir a contento os negócios dos senhores do dinheiro. “Nessas ocasiões, não raramente forças externas ao sistema, ou emergentes de suas catacumbas, aparecem como a única tábua de salvação para reorganizar a vida política e permitir à burguesia impor seu programa de classe”, explicou. “Esse também parece ser o caso do fenômeno representado por Bolsonaro, o liberal-fascismo.”
Forças Armadas no governo Bolsonaro
De acordo com o expositor, “Bolsonaro foi o cavalo no qual montaram as Forças Armadas, mesmo que a contragosto em um primeiro momento, porque nele viram a via institucional para recuperar seu papel de poder tutelar”.
Marcelo Camargo/Agência Brasil
Análise de Altman acontece diante da tensão provocada pelo desfile da Força de Fuzileiros da Esquadra nesta terça
Para Altman, no entanto, há dois diferentes tipos de bonapartismo no Brasil, “o que explica a contradição latente entre Bolsonaro e o alto comando das Forças Armadas, ou parte dele”. O presidente representaria um bonapartismo imperial, que imagina a si próprio como o centro de um novo sistema de poder, que deveria nascer no âmago das velhas estruturas, a partir de sucessivos conflitos e aproximações. As Forças Armadas, por sua vez, expressariam um “bonapartismo institucional”, que deveria ser exercido pela própria instituição, de forma velada e protegida por um manto de legalidade e democracia formal.
Altman ainda ponderou que, enquanto não houver uma alternativa que viabilize o bonapartismo institucional sem o atual presidente, “é com ele que marcharão, pois seus grandes inimigos são a oposição de esquerda, o PT e Lula, os movimentos sociais e o sindicalismo”.
“Poderão abandonar Bolsonaro em algum momento, na medida em que ele se torne disfuncional ao seu modelo de bonapartismo, mas desde que haja uma porta de saída que não entregue o comando do Estado às forças historicamente combatidas pelo partido militar”, reiterou.
2022
Altman não descarta o surgimento de uma candidatura militar nas eleições de 2022. Enquanto que, para Bolsonaro, o jornalista analisa que seus objetivos táticos centrais seriam sobrevivência e reeleição.
“A vitória nas urnas poderia significar aval para o avanço na construção de um Estado policial, submetendo as instituições a um bonapartismo legitimado pela vontade popular. Por ora, os comandantes militares seguem essa mesma linha, mesmo com alguns paradigmas distintos, desconfiados do cavalo no qual resolveram montar e em suas manobras perigosas”, refletiu.
Isso não significa, contudo, que a oposição de esquerda deva subestimar o risco de uma ruptura ou de um golpe, advertiu Altman, “pois o bolsonarismo pode mudar seu plano tático pendular, entre a mobilização de sua base mais radical e a composição com setores tradicionais do parlamento, e até mesmo ter apoio de militares e policiais por todo o país.
Por isso, o jornalista acredita ser importante denunciar e se mobilizar cada vez com mais força contra as ameaças de autogolpe, “o que implica em intensificar a campanha pela saída de Bolsonaro, que ganhou as ruas a partir de maio”.
“Mas esse rumo pode ser adotado de duas formas: reforçando o papel e a independência da própria oposição de esquerda, reivindicando o impeachment de Bolsonaro e a convocação de eleições presidenciais antecipadas, para que o Brasil volte a ter um governo popular, de ruptura com o neofascismo e o neoliberalismo; ou abdicando desse protagonismo de esquerda, abrindo espaço para o que se chama de ‘terceira via’ ou até mesmo para o bolsonarismo sem Bolsonaro, que poderia ser representado por um governo do general Hamilton Mourão”, concluiu.