No programa 20 MINUTOS ENTREVISTA desta segunda-feira (28/03), o jornalista Breno Altman entrevistou a filósofa, professora e escritora Márcia Tiburi. Ela retomou as origens do patriarcado para analisar o atual cenário político brasileiro.
Segundo a filósofa, trata-se do sistema mais antigo de todos e o que acabou gerando o capitalismo, que tem em sua raiz a exploração do trabalho, sobretudo feminino.
Mesmo na esquerda, ela destacou que as mulheres sempre foram relegadas a papéis de menor relevância e que a história que foi escrita e que se conta é a partir da perspectiva do homem branco cisgênero. Em sua opinião, nenhuma experiência rompeu a nível cultural essa construção, nem a União Soviética, por exemplo.
“Os homens têm uma relação narcísica com o poder. Mesmo na revolução bolchevique, a única mulher de destaque reconhecido foi Rosa Luxemburgo, mas ela não viveu muito para virar uma liderança com poder de decisão, por exemplo. Não é possível ser machista sem ser e narcisista, de ter o pensamento de ser a autoridade máxima, ser a lei, se achar o dono de uma nação e fazer uso de discursos violentos e da própria violência. [Josef] Stalin entraria nessa categoria, [Vladimir] Putin também. Nenhum deles está interessado em melhorar a vida do povo, só em conseguir mais poder”, refletiu Tiburi.
Por outro, ela reconheceu a existência de líderes que rompem com esse padrão, como o ex-presidente Lula: “é um homem feminino, ou feminista”. Ela explicou que o ex-presidente tem certo nível de narcisismo, “mas não governa a partir dele”, basta ver suas políticas públicas direcionadas à população e a própria recomendação e defesa de Dilma Rousseff como candidata e presidente.
Por isso mesmo, ela disse não se sentir confortável com a possibilidade de que Geraldo Alckmin seja seu vice, “ao mesmo tempo, entendo os motivos pelos quais ele faz isso. Como acalmar essa gente que não tem nenhum tipo de escrúpulos? Só chamando uma figura os acalme”.
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Em entrevista, Tiburi retomou origens do patriarcado para analisar cenário político brasileiro
De todos modos, a eleição de Lula pode representar a recuperação de um “patamar básico” de democracia, na visão da filósofa. Ela lembrou as diversas tentativas do governo Bolsonaro de enfraquecer a democracia brasileira e disse ser preciso eleger Lula “porque é ele que nós temos. Precisamos ser mais pragmáticos e menos idealistas. Temos um governo fascista e quando se tem fascismo, não se tem democracia”.
“Não é de uma hora para a outra que chegaremos à luz no fim do túnel. Precisamos avançar rumo a uma democracia radical, com todos os atores e atrizes entrando em cena, divergindo e dialogando”, enfatizou.
‘Nazifascismo de Estado’
Para Tiburi, “fascismo” é uma categoria de análise válida para entender o governo e a política de Jair Bolsonaro, que ela mesma definiu como “fascismo de Estado ou nazifascismo de Estado”. Isto é, um movimento com a força das massas que é racista, misógino e violento, e cuja forma de pensar é utilizada como estratégia política.
“Acho que de forma geral o capitalismo é autoritário e fascista. O fascismo está no DNA do capitalismo, é a exacerbação das formas político econômicas do patriarcado”, agregou.
Essa estrutura se mantém devido à eficiência do capitalismo em convencer as pessoas de seus rituais, de que é quase uma religião, para que se comportem “em conformidade àquilo que foi supostamente pré-determinado para as classes, e aí é preciso acertar no sentimento das pessoas, para que elas formem parte do teatro. Não basta oprimir um corpo, ele precisa aceitar essa opressão”.
Assim, todos os governos burgueses, de acordo com a filósofa, seriam, de alguma forma, “proto-fascistas”, e é por isso que Bolsonaro, apesar de seu governo desastroso, conta com uma sólida base de apoio.
“Ele só se sustenta porque é sustentado por outros como ele, porque há pessoas como ele no poder, porque a mídia corporativa esteve a seu lado. Ele joga com uma retórica de destruição da alteridade que funciona muito bem. No Brasil a gente tem uma democracia machista branca, mais do que uma democracia burguesa, então é claro que ele não vai perder essa base”, defendeu.