No programa 20MINUTOS ENTREVISTA desta quarta-feira (28/07), o jornalista Breno Altman entrevistou o advogado, educador e coordenador do Projeto Brasil Popular, Ronaldo Pagotto, sobre a rede e as saídas de desenvolvimento para o país.
Para ele, o neoliberalismo “rebaixou o horizonte programático do país”. No entanto, projetos como o Brasil Popular, visam voltar a diagnosticar o cenário brasileiro e discutir alternativas por meio de uma democracia mais participativa.
O projeto, que nasceu depois da ofensiva conservadora de 2014, inclui organizações populares, como o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, e centros de pesquisas – como a Fundação Perseu Abramo, do Partido dos Trabalhadores -, “para acumular reflexões e pensar um projeto de curto e médio prazo”.
“Programa de governo a gente consegue construir com alguma unidade, mas projeto de Brasil é uma coisa que não é só regida pelo calendário eleitoral. Queremos debater questões mais amplas, que ultrapassem isso. Estamos desacostumados a pensar em saídas de médio prazo, pensamos no imediato. Falta pensar no futuro”, discorreu Pagotto.
Isso não significa, contudo, que o projeto seja anticapitalista: “Não fizemos um recorte de superação do capitalismo, mas temos propostas mais avançadas, como o tema da reforma agrária”.
Por outro lado, o projeto vê como essenciais a discussão sobre direitos civis, por exemplo, o combate ao racismo, ao machismo, a legalização do aborto, entre outros temas.
“Sem esses elementos, não há debate de projeto nacional. Travamos uma batalha de ideias para construir mais que um programa de governo, mas um diálogo popular sobre o Brasil que a gente quer e precisa construir. Se a gente não conseguir fazer esse debate chegar na sociedade, não vamos mudar esse país”, reforçou.
Posicionamentos
Pagotto falou sobre a forma como o projeto se posiciona sobre diversos temas atualmente sendo debatidos entre os movimentos de esquerda. Por exemplo, o tema da democratização: “Precisamos construir uma democracia forte, com a participação popular, mais consultas, maior controle popular. Temos uma democracia de baixa intensidade, em que as pessoas são convidadas a participar só a cada dois anos, sem maiores reflexões”.
O advogado também refletiu sobre o tema da tutela militar do Estado. Disse acreditar que o tema ficou “adormecido”, já que, após a ditadura, os militares tiveram uma participação “tímida”, mas que é necessário voltar a debater o tema, já que ele mistura democracia e soberania nacional.
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‘Estamos desacostumados a pensar em saídas de médio prazo, falta pensar no futuro’, disse Pagotto
O Projeto Brasil Popular também defende uma reforma tributária, já que, atualmente, os impostos prejudicam o consumo, não recaindo sobre a renda: “É uma injustiça, pois recai sobre as camadas populares. É mais uma das atrocidades do neoliberalismo”.
Pagotto também explicou que em vários âmbitos o projeto, que busca fazer um diagnóstico estrutural do Brasil, defende uma maior presença estatal. Por exemplo, com relação à energia: “Precisamos de soberania energética para dar sustentação ao desenvolvimento e o Estado nacional precisa estar presente para atender as necessidades da população. A produção, a distribuição e o resultado devem ser geridos pelo Estado”.
O mesmo vale, na opinião do advogado, aos sistemas de extrativismo agrícola e mineral do Brasil, que devem ser alterados a fim de realizar uma “reversão colonial”.
“Só acentuamos o papel de economia emergente. Precisamos reverter essa triste sina de país agricultor, minerador. Isso, porém, não é algo que se possa enfrentar só com um projeto de governo de quatro anos. É preciso um projeto nacional para terminar de diagnosticar esse processo de forma mais profunda e reverter esse quadro”, enfatizou.
Por isso, Pagotto defendeu um processo de industrialização que não esteja ligado à financeirização do sistema e que, ao mesmo tempo, esteja comprometido com o meio ambiente.
“Se não conseguirmos pensar um projeto nacional de superação da recolonização, conjugado com igualdade, diversidade, respeito e convívio, vamos repetir modelos ou criar falsas saídas”, ressaltou.
Para ele, é “indignante”, ter um país com fome e especulação no peso dos alimentos, mas não basta um modelo como o do agronegócio, que só quer expandir as terras cultiváveis. O Projeto Brasil Popular defende um melhor aproveitamento do sistema industrial, atualmente exportador apenas de materiais de baixo valor agregado, e reforma agrária, para reaproveitar as terras cultiváveis.
Assim, de cara ao futuro, o projeto está concluindo dois novos documentos, um mais resumido e o outro mais denso, que coloca os debates que o grupo pretende desenvolver.
“Queremos que sejam subsídios, para que possamos realizar jornadas de debates nacionais que sirvam de base à mudanças reais”, reforçou.