No programa 20 MINUTOS ENTREVISTAS desta quarta-feira (08/09), o jornalista Breno Altman entrevistou Valter Pomar, dirigente petista e professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC, sobre as manifestações do dia 7 de setembro e os rumos que deve tomar a esquerda daqui em diante.
Para o professor, não se pode esperar as eleições de 2022 para derrotar Bolsonaro – o enfrentamento deve ser feito agora: “Não estão garantidas as eleições de 2022, nem que vão ocorrer, nem que nós vamos ganhar e nem que quem ganhe vá poder tomar posse. Diante disso, a opção é se movimentar muito”.
Por isso, Pomar defendeu a importância do impeachment e a combinação da luta institucional com a mobilização social que, segundo ele, ainda é insuficiente, pois não engaja toda a classe trabalhadora. De momento, ele identifica as manifestações como sendo de militantes, não das grandes massas, “isso é porque temos crise, desemprego, medo da pandemia, mas, principalmente, porque a esquerda perdeu capilaridade social. Temos que levar o impeachment para a periferia”.
O dirigente petista rejeitou a teoria de alguns analistas de que um impeachment seria “um tiro no pé”, porque colocaria o vice-presidente, general Hamilton Mourão, no poder.
“A gente defende o impeachment pelo risco que Bolsonaro representa para a sobrevivência dos direitos e liberdades que ainda restam, e para as próprias eleições. Falamos de um miliciano, de um genocida. O simples fato de o presidente ir à avenida Paulista promover o golpe abertamente e continuar presidente no dia seguinte é um retrato do momento em que a gente vive”, argumentou.
O ideal, para ele, seria lutar para afastar Bolsonaro, Mourão e antecipar as eleições. “É difícil de ocorrer, mas é o correto a se defender”, afirmou.
Além disso, ele relembrou que a luta nas ruas pelo “Fora, Bolsonaro” contribuirá no longo prazo para dar governabilidade a um novo governo de esquerda. Pomar lamentou que houve “uma domesticação cerebral de uma parte da esquerda brasileira”, que confiou que a transformação do Brasil viria pela luta institucional e eleitoral, principalmente.
Em sua leitura, enquanto a esquerda foi se acomodando do ponto de vista da mobilização social, a direita foi ficando cada vez mais cruel. Por isso, “temos que mostrar nossos dentes, senão eles vão quebrar nossos dentes”.
“Para quem acha que o momento ideal de lutar é em 2022, não percebe que a simples conquista de uma vitória presidencial não nos dota da força necessária para fazer as mudanças que queremos fazer. Ou fazemos muita luta agora, ou mesmo num cenário de vitória não conseguiremos governar um país que é muito diferente daquele que recebemos em 2003”, enfatizou.
Manifestações do 7 de setembro
O professor, então, comemorou as manifestações de esquerda no dia 7 de setembro. Disse que a decisão de mantê-las foi acertada e analisou o comportamento de parte da esquerda que se opunha a sua realização.
Primeiro, o medo da comparação numérica, pois, “obviamente”, as mobilizações bolsonaristas seriam maiores quantativamente naquele momento. “Mas a gente não vai às ruas só quando tem maioria. Aliás, a gente consegue maioria quando vai às ruas sistematicamente”, disse.
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Valter Pomar foi o entrevistado desta quarta (08/09) de Breno Altman no 20 MINUTOS ENTREVISTAS
O segundo motivo identificado por Pomar foi o medo de agressões, o que acabou não se confirmando, “até porque o alvo principal da manifestação bolsonarista era um setor da elite, não a esquerda”. O terceiro e último é que não se deveria dar atenção para o que Bolsonaro estava fazendo, “mas não se trata disso, de subestimar o inimigo”.
Ele reforçou a importância de não agir como se as eleições estivessem garantidas. “Uma das grandes conquistas nossas dos últimos meses foi reconquistar as ruas. Entregá-las no Dia da Pátria para o neofascismo seria uma tolice política. Não podemos subestimar nem superestimar o inimigo. O que virá pela frente não é uma disputa eleitoral tradicional e, por isso, ocupar as ruas é necessário, e aprender a reocupá-las em condições de hostilidade”, disse.
O dirigente petista ainda comentou a crítica que fizeram alguns a Lula por não ter convocado nenhuma manifestação, por não aparecer ou discursar nos protestos. Segundo ele, o papel de Lula é diferente do papel do PT. “Não me preocupo com o que Lula está fazendo ou deixando de fazer. A minha preocupação maior é que nas organizações da classe trabalhadora brasileira se enfrente o problema como ele deve ser enfrentado.”
Enfrentar o problema significa entender qual é o plano de Bolsonaro. De acordo com o professor, este seria manter-se na Presidência “custe o que custar”, ainda que, em sua leitura, Bolsonaro daria preferência para criar condições para uma vitória eleitoral, a fim de manter o apoio das classes dominantes.
“Uma parte crescente das elites acha que ele vai perder as eleições, então está se movimentando para tirá-lo do caminho. Só assim poderiam construir uma candidatura capaz de derrubar Lula. Bolsonaro está preocupado com isso, então vai atacar um dos dois canhões das classes dominantes: o Supremo ou a TV Globo. Agora o alvo é o STF. E acho que a manifestação bolsonarista foi exitosa no sentido de mostrar para esse setor da direita de que ele tem bala na agulha, de que ele não vai cair sem lutar”, explicou.
Tática política para 2022
Diante desse cenário, Pomar refletiu sobre a tática eleitoral da esquerda e do PT, concretamente. Para ele, a campanha de Lula deve ser ainda mais radical do que foi em 1989 devido à quantidade de retrocessos que aconteceram desde o golpe de 2016.
Por isso, o professor rejeitou a possibilidade de formação de uma Frente Ampla, sugerida por alguns analistas que comparam a situação atual com a das Diretas Já. Segundo ele, não há a unidade que havia naquele momento, inclusive há setores cujos alvos são o próprio Lula e o PT, mais do que Bolsonaro, “como é o caso do cirismo”, de modo que convocar manifestações conjuntas poderia gerar conflitos.
“Eu prefiro e estimulo que a direita não bolsonarista convoque suas manifestações, demonstre sua força real e não utilize a esquerda como escada, mas se manifestar em conjunto seria um equívoco com um desdobramento problemático. No fundo, essa oposição quer colocar a esquerda como caudatária dela. Também quero relembrar que não está dado que vamos enfrentar Bolsonaro em 2022. Por isso, todo cuidado é pouco”, ressaltou.
Para Pomar, uma das bandeiras a serem levantadas é a da convocação de uma Assembleia Constituinte, que inclusive já se tornou uma reivindicação oficial do PT que, na década de 1980, votou contra a Constituição de 88, apesar de assiná-la, por já considerá-la limitada.
“Já experimentamos a política de preservar e implementar a Constituição de 1988, e teve limites porque, naqueles marcos, era pouco o que a gente podia fazer. Agora, com a Constituição ainda mais rasgada depois do golpe, o espaço para se movimentar é menor ainda. Temos que convocar uma Assembleia Constituinte”, reforçou.