No programa 20 MINUTOS INTERNACIONAL desta quinta-feira (17/03), o jornalista e fundador de Opera Mundi, Breno Altman, entrevistou o advogado Hugo Albuquerque, que também é publisher da Jacobin Brasil e editor da Autonomia Literária, sobre o conflito que vem se desenrolando na Ucrânia.
Ele o caracterizou como uma “disputa intercapitalista assimétrica”. De um lado estão os Estados Unidos, cuja intervenção nas relações russo-europeias, impulsionadas pela ameaça dos gasodutos à hegemonia de seu fornecimento energético para o mundo, são a causa da guerra. Do outro, está a Rússia, “que ocupa um ponto paradoxal”, por ser uma potência, na prática, média, cuja principal fonte de renda é a exportação de commodities, mas que herdou um aparato militar.
“A Rússia é um país da periferia, sofre com a pressão das potências, mas é um país capaz, ao contrário do Brasil, por exemplo, de resistir às provocações que a gestão [Joe] Biden se mostra muito afoita em estimular. O lastro do dólar é a relação dele com a compra do petróleo, a matriz energética está atrelada à matriz monetária, então quanto mais a Europa compra gás da Rússia, mais nos aproximamos de um cenário em que o preço do gás e do petróleo possa ser negociado em outra moeda que não o dólar, atacando a hegemonia dos EUA. Então eles confrontam esse mundo que lhes escapa e que pode parir uma nova ordem global”, explicou.
Albuquerque destacou que a expansão da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), que funciona como “a polícia do mundo” controlada pelos Estados Unidos, “é uma ameaça à segurança global. A Rússia não”.
“A Otan representa uma ameaça até para o Brasil. A causa de sua expansão é a natureza do Putin? Não. É para controlar os fluxos de distribuição energética para a Europa e a manutenção da hegemonia norte-americana”, reforçou.
Por isso, para ele, uma vitória de Putin na Ucrânia, e a consequente derrota de Volodymyr Zelensky, seria “um fato progressivo para o mundo”. Ele lembrou que o presidente ucraniano é leniente com grupos nazistas, que dominam o país, e que para os EUA é estratégico manter o conflito, enviando armas, sem propor nenhuma solução.
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Publisher da Jacobin Brasil considerou que guerra no leste europeu é ‘intercapitalista, mas assimétrica’
Fim da ordem unipolar
Para o advogado, o conflito representa o fim da ordem unipolar, dominada pelos norte-americanos. Embora isso pareça, e até seja, positivo, na opinião de Albuquerque, levará a um momento de conflitos, bipolar, “porque os EUA não vão aceitar essa quebra do mundo unipolar. E, se ninguém parar Biden, pode ser que ele deixe até de aceitar as democracias da América Latina, caso a gente questione suas operações”.
“Acho que desse conflito veremos um grau de mortalidade muito alto, um sistema mais fechado, que estimule mais guerras e crises ambientais. Ao mesmo tempo que será um momento de horror, abrirá espaço para movimentos mais radicais, antissistema, inclusive de esquerda, porque o reformismo vai parecer mais utópico do que uma ruptura definitiva do sistema”, ponderou, afirmando que, diante desse cenário, a esquerda será obrigada a romper com a II Internacional. “Para que vamos querer reformar o mundo que vai surgir?”, questionou.
Postura brasileira
Albuquerque defendeu que a política brasileira em relação a todo esse conflito deve ser a de maior neutralidade possível e que todas as colocações daqui pra frente deverão ser muito cuidadosas, “porque uma declaração mal colocada pode ter sérias consequências”.
Enquanto isso, ele argumentou que o Brasil deve buscar estabelecer uma integração latino-americana, sem romper com os BRICS. Pelo contrário, principalmente diante da eminência de uma nova ordem bipolar, devemos fortalecer os laços com o grupo e aproximá-lo da América Latina, principalmente da Venezuela, por seu petróleo, e a Bolívia, por seu lítio.
“É evidente que temos que continuar dialogando com EUA e Europa, mas devemos, sobretudo, buscar uma integração latino-americana forte. Vai ser uma tarefa difícil porque, quando começarmos, os EUA virão nos pressionar”, refletiu.