Com origem que remonta ao século XVIII, a palavra “greve” surgiu às margens do Sena, em Paris, na praça que passou a ser chamada de Place de Grève. Originalmente significando “margem”, o termo foi usado para definir o espaço onde trabalhadores desempregados costumavam se reunir na tentativa de encontrar emprego.
A partir do século XIX, no entanto, a praça passou a ser ponto de encontro de assalariados que estavam descontentes com suas condições de vida e de trabalho e era ali que protestavam. Estes trabalhadores entrariam, então, no que foi chamado de greve.
Desde 1803, a Place de Grève se tornou a Place de l’Hôtel-de-Ville. O jornal diário francês Sud-Ouest relembra que o lugar possui uma reputação infame, já que foi um espaço de execuções públicas durante a Idade Média e ainda ter recebido uma guilhotina em 1792, ano de abolição da monarquia francesa.
Não apenas contra o Antigo Regime
Excluindo a Revolução Francesa, há alguns casos isolados de greves neste país europeu em tempos antigos que ficaram conhecidos. Entre eles estão uma em Bordeaux e outra em Lyon.
O caso de Bordeaux ocorreu em 1511. Trabalhadores responsáveis pela drenagem de um canteiro de obras da catedral de Saint-André, hoje parte da Place Pey Berland, deixaram de trabalhar e sabotaram as instalações para conseguirem melhores salários e condições laborais.
Já em 1539, Lyon veria um evento semelhante, mas entre os tipógrafos. Considerada a primeira greve operária do país, ocorreu quando todas as oficinas tipográficas da cidade cessaram suas atividades. A greve persistiria até 1544.
A Revolução Francesa segue no imaginário popular até hoje. Com início em 1789, buscava liberdade, igualdade e fraternidade. Paradoxalmente, com ela, as greves se tornaram ilegais no país durante um grande período de tempo. Em julho de 1791 é aprovada da lei de Le Chapelier, que abolia corporações e proibia qualquer coalizão de trabalhadores, a fim de preservar a autoridade do Estado francês.
Só que, sendo o país reinado por Luís XVI, a insatisfação dos franceses se multiplicava, assim como as greves. Foi em 1792 que a mobilização popular destronou o rei, fazendo com que o Antigo Regime chegasse ao fim.
O movimento revolucionário teria fim em novembro de 1799, com a tomada de poder de Napoleão Bonaparte, sob o apoio da burguesia francesa, em um evento conhecido como Golpe do XVIII de Brumário.
A lei de Le Chapelier foi reforçada por Napoleão I anos mais tarde, em 1810, com um novo Código Penal. Os franceses, no entanto, não deixaram de se manifestar, de acordo com o Sud-Ouest.
Entre os anos de 1831, 1834 e 1848 haveriam outras greves em Lyon, que ficaram conhecidas como Révolte des canuts. Estes levantes estão entre os primeiros feitos durante a era da Revolução Industrial.
Domínio Público
Trabalhadores com cartaz durante grande greve geral em junho de 1936
A primeira revolta de Canut, em 1831, teria sido provocada pela queda nos preços da seda, que abaixou os salários dos trabalhadores. A segunda, três anos mais tarde, ocorreu após donos de empresas tentarem reverter um aumento geral nos salários. A última aconteceu por questões parecidas, motivada também pela exploração dos operários.
Ao final do século XIX e início do século XX, operários e trabalhadores de países industrializados se juntavam a movimentos sindicalistas e lutavam contra suas explorações por meio de greves. A data de 1º de maio se torna simbólica após a disrupção sangrenta da greve geral de Chicago, nos Estados Unifos, no ano de 1886.
As greves gerais francesas: 1936, 1968 e 1995
Em junho de 1936, após a vitória eleitoral da Frente Popular no país, as massas francesas se juntavam em uma greve geral com um objetivo: novos direitos trabalhistas, que foram concedidos por meio dos acordos de Matignon. A mobilização resistiu durante um mês.
Primeiro exemplo de uma grande greve geral realizada com sucesso dentro da França, foram os eventos de 1936, que trouxeram feriados remunerados, a semana de 40 horas e aumentos salariais significativos.
Já em maio de 1968, oito milhões de grevistas tentavam consolidar os direitos adquiridos em 1936. Também durando um mês, e iniciada por estudantes, a greve geral que se espalhou fez com que o país parasse.
Ao fim da cessação voluntária e coletiva do trabalho fez com que os franceses conseguissem um aumento de 35% no salário mínimo, aumento de 10% nos salários, redução no horário de trabalho e compromissos com os direitos sindicais.
Com duração de quase um mês, a última grande greve efetuada no país, que teve início em 15 de novembro de 1995, foi pautada pelas reformas previdenciária e ferroviária, e teve um índice de grevistas de 85%. A greve também ocorreu no transporte público, fazendo com que fosse paralisado, totalmente, por três semanas.
Em 12 de dezembro de 1995, dois milhões de manifestantes iam para as ruas de toda a França. Dias mais tarde, o primeiro-ministro da época, Alain Juppé, desistiu de alterar a idade de aposentadoria.
Agora, em 2023, em meio a grandes protestos após a aprovação da reforma previdenciária proposta pelo governo de Emmanuel Macron, que a aprovou através da aplicação do artigo 49.3 da Constituição francesa, que permite sancionar um projeto de lei sem que seja votado no Parlamento, os franceses ocupam as ruas.
As manifestações contra o projeto de alteração das leis de aposentadoria francesa têm ocorrido desde janeiro, quando foi apresentado por Élisabeth Borne, a primeira-ministra do país.
No começo de março, ocorreu a 6ª jornada de manifestações contra o projeto. Sindicatos afirmaram que 3,5 milhões compareceram, e a jornada ultrapassou os recordes batidos em 31 de janeiro, quando 1,27 milhão de pessoas haviam ido às ruas.
A promessa de uma reforma foi parte central da campanha de Macron para a Presidência francesa em 2022. Com o plano de seu governo, franceses devem, a partir de 2030, se aposentar com 62 ou 64 anos.