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A Grécia deve deixar a zona do euro?
NÃO
Alguns analistas da academia, de bancos e até alguns desavisados têm lançado diversas opiniões quanto à necessidade da saída da Grécia da zona do euro.
Antes de avaliarmos os prós e contras dessa medida, que já adianto ser contrário, acredito que valha a pena quebrar alguns “paradigmas” econômicos, além de “desestigmatizar” a imagem dos países periféricos da zona do euro, maldosamente interpretados como perdulários.
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Quando uma região ou grupo de países resolve abrir mão de suas moedas, seguindo uma trajetória de unificação monetária, a estabilidade do movimento repousa apenas na premissa de que a região seja uma área monetária ótima, gozando de grande flexibilidade de salários, fortes relações comerciais entre os países participantes, mobilidade de fatores e, o mais importante, a existência de uma autoridade fiscal central. Trocando em miúdos, para que uma área monetária seja considerada ótima, uma única política monetária deve servir a todos os membros participantes.
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Se a taxa de juros determinada pelo Banco Central da Europa (BCE) for adequada ao ciclo econômico da Alemanha, como o foi, mas inadequada, principalmente, aos países periféricos, que certamente experimentaram taxas de juros bem abaixo do necessário por vários anos, então pelo menos um ou todos os cenários a seguir se formarão: a) bolha de ativos, principalmente na Espanha e Irlanda, e/ou; b) aumento do custo unitário da mão de obra.
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O cenário (a) parece ser autoexplicativo. Mas, por que será que taxas de juros excessivamente baixas levam a um aumento do custo unitário da mão de obra e, conseqüentemente, menor competitividade? Taxas de juros muito baixas ou negativas em termos reais, depois de descontadas pela inflação do país, aumentam o consumo e o poder de barganha dos sindicatos, já excessivamente fortalecidos no caso europeu.
Maior custo unitário da mão de obra e maior inflação, se comparado a Alemanha, resultam em menor competitividade e maior fragilidade externa, como nota-se na evolução dos déficits em conta corrente dos países periféricos.
Ou seja, o desbalanceamento econômico ocorrido na Europa antes da eclosão da crise da subprime nos EUA em 2008, ocorreu devido à zona do euro não ser caracterizada como uma “área monetária ótima”, onde uma única taxa de juros não serviu a todos os países, e não à preguiça ou leniência com o trabalho duro que muitos analistas tendem a utilizar como fator primordial para o desbalanceamento da região.
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Mas, passado é passado. Não há dúvidas quanto ao equivoco em unificar apressadamente as moedas de uma região que não se caracterizava como uma área monetária ótima, muito menos sem a formação de um arcabouço claro de união política e fiscal entre seus membros.
A questão agora é como sair desse imbróglio da melhor forma possível, se é que isso seja possível. Poderia se cogitar em desmantelar a zona do euro iniciando pela Grécia. Afinal, trata-se um país muito pequeno que, convenhamos, nem deveria ter entrado.
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Explico porque a Grécia não deve sair da zona do euro, o que em nada se deve ao tamanho de sua economia. Se a alternativa de abandono da zona do euro pela Grécia ocorresse, me atreveria a rascunhar os seguintes cenários:
1) Qualquer sussurro de abandono da zona do euro suscitaria uma corrida bancária, o que fragilizaria a situação dos bancos locais e daqueles que tivessem relações interbancárias (mesmo de outros países), ocasionando uma crise bancária onde o governo deveria assumir a dívida posteriormente, via aumento ainda maior de seu endividamento público ou via emissão monetária, entenda-se, inflação;
2) Dívidas assumidas em euro e pagas em, digamos, “novos dracmas” representam calote. Ou seja, o mercado financeiro internacional ficaria fechado para a Grécia por um bom tempo;
Carlos Latuff
3) Certamente os players do mercado financeiro internacional se perguntariam “quem seria o próximo a sair?”. Daí, entrariam na fila de prováveis alvos Portugal, Itália e Espanha;
4) Não existe a possibilidade sensata de apenas os países periféricos abandonarem a zona do euro. Se isso acontecer, esses mesmos países criariam novas moedas e novos Bancos Centrais. Essas novas moedas já “surgiriam” maxidepreciadas como forma de aumentar a competitividade de suas economias frente a seus parceiros, e cada nação tenderia a depreciar sua moeda mais do que seu vizinho. Como países remanescentes da zona do euro, teríamos apenas a Alemanha e a França, sendo que, em relação a esse último, ainda restariam dúvidas.
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Este cenário de maxidepreciações cambiais dos países periféricos, e de apreciação do euro (ou a moeda da Alemanha, de forma simplificada) suscitaria um cenário de alta inflação na Europa. Guardadas as devidas proporções, isso já foi visto em 1933, após a crise de 1929, quando os EUA criaram o infame “Smoot-Hawley Tariff”, impondo tarifas retaliatórias no comércio internacional. Como represália, várias nações, especialmente da Europa, depreciaram suas moedas, deflacionando suas dívidas via inflação (calote) e pavimentando a subida de líderes populistas em algumas nações, principalmente na Alemanha (Hitler).
Obviamente que, se a quebra da zona realmente se materializar, a humanidade não pode aceitar a subida de “líderes” como no passado, mas, provavelmente, veríamos o surgimento de alguns “Chávez” e “Kirchner” europeus.
(*) Roberto Dumas Damas é professor do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa), mestre em economia chinesa pela Fudan University e mestre em economia pela Universidade de Birmingham
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