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Entrar na União Européia é uma boa solução para as ex-repúblicas soviéticas? SIM
As recentes manifestações ocorridas na Ucrânia levantam a questão sobre qual deve ser o relacionamento das ex-repúblicas soviéticas com a UE (União Europeia). A decisão do presidente ucraniano Viktor Yanukovich de rejeitar uma integração mais profunda com a UE para, em vez disso, aprofundar laços com a Rússia, tem diversas implicações importantes. No plano econômico, significa a escolha por um modelo de integração liderado por um país que na prática tem pouco mais para oferecer aos ucranianos do que gás natural a preços mais camaradas, além de um duvidoso pacote de ajuda financeira.
Apesar do crescimento econômico russo dos últimos anos – fruto em grande parte de condições internacionais extremamente favoráveis para países exportadores de commodities – no longo prazo, a aposta de Yanukovich pode mostrar-se equivocada e uma crise profunda na Rússia não deve ser descartada. No plano político, significa aprofundar relações com um governo de características autoritárias, cujas sucessivas violações de direitos humanos e corrupção endêmica são mais do que conhecidas.
Não surpreende que o próprio Yanukovich tem feito esforços no sentido de controlar a imprensa ucraniana, além de ser constantemente acusado de corrupção, nepotismo, e perseguição a adversários (o mais notório caso sendo o de Yulia Tymoshekno, sua rival nas eleições de 2010). Aparentemente, Yanukovich é um admirador do estilo autoritário de Putin, o que em parte pode ajudar a explicar sua escolha por uma aproximação maior com os russos. Finalmente, no plano simbólico, significa reavivar memórias sombrias do período em que a União Soviética subjugava a Ucrânia. A história conta.
Evidentemente que nem todas as ex-repúblicas soviéticas têm uma margem de manobra ampla para fazer esse tipo de escolha dadas as limitações impostas pela geopolítica. Assim, as ex-repúblicas soviéticas centro-asiáticas não dispõem do mesmo leque de opções disponível, por exemplo, aos países bálticos que, assim que puderam, trataram logo de aderir à União Europeia. Letônia, Estônia, e Lituânia, a propósito, além de demonstrarem indicadores bastante favoráveis desde que entraram na União Europeia, estão entre os países do bloco que tiveram maior crescimento econômico após a crise econômica deflagrada em 2008.
No caso da Ucrânia, existe uma escolha concreta entre ser parte da Europa ou da Eurásia. Evidentemente, a Ucrânia é um país de dimensões muito maiores que os três pequenos países bálticos, o que dificulta uma comparação mais precisa. Para isso, devemos olhar para outro país que fazia parte da órbita soviética e buscou desvencilhar-se de um passado sombrio recente.
Agência Efe
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Com uma economia muito maior que a da Ucrânia e com população um pouco menor, a Polônia tem se beneficiado grandemente desde a sua entrada na União Europeia em 2004 e, assim como os países bálticos acima mencionados, demonstrou números bastante significativos de crescimento econômico em 2012. As exportações polonesas que eram de cerca de 47 bilhões de euros em 2003 foram para um recorde histórico de 142 bilhões de euros em 2012, transformando-se em um dos principais pilares da economia polonesa, sendo que mais de 75% dessas exportações tem como destino a União Europeia.
Além disso, ao entrar na União Europeia, a Polônia teve acesso a uma série de mecanismos disponíveis no orçamento europeu, como o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional e o Fundo Social Europeu, além do chamado “Fundo de Coesão”, destinado a diminuir divergências econômicas e sociais entre os países-membros e apoiar projetos de infraestrutura nos países menos desenvolvidos do bloco. Finalmente, do ponto de vista político, a integração com a União Europeia teve um importante impacto na consolidação da democracia polonesa. Certamente, os manifestantes em Kiev não ignoram essas questões. Na verdade, o que resta a Putin – e o que explica em parte a decisão do presidente ucraniano – é apelar para chantagem econômica, ameaçando corte no suprimento de gás (o que já foi feito quando presidentes menos amistosos aos russos estavam no poder) e imposição de sanções.
Ou seja, de um lado, temos um projeto de poder representado na figura de Putin e seus apoiadores, ao passo que de outro, temos um projeto consistente de integração política e econômica. Sempre que têm a chance, os países da órbita da ex-União Soviética tem optado pelo segundo, o que não é surpreendente.
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Não é à toa que, de acordo com o Pew Research Center, até 2009 os poloneses eram um dos mais entusiasmados defensores dos benefícios da entrada na União Europeia, com 63% da população julgando ser isso uma “boa coisa” e apenas 9% contrários. Uma pesquisa de um instituto polonês (GfK Polonia) realizada em abril de 2013, mostrou que 78% dos poloneses eram favoráveis a presença da Polônia na União Europeia. A pesquisa do Pew Research Center indica que lituanos, eslovacos e búlgaros também demonstram um baixíssimo nível de rejeição à integração de seus países ao bloco europeu.
É interessante notar que ao passo que a crise econômica teve um impacto negativo evidente nesses números, na ex-república soviética da Lituânia, a porcentagem dos que consideram uma “boa coisa” a entrada na União Europeia cresceu de 44% em 2009 para 49% em 2012, com o número dos que rejeitam permanecendo em 8%. Com ou sem crise, os lituanos não querem voltar ao passado.
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Isso posto, parece evidente que a melhor alternativa no longo prazo do ponto de vista político-econômico para as ex-repúblicas soviéticas do leste europeu é a busca de uma maior integração com a União Europeia. Sem dúvida interessa a eles, o que pode ser ilustrado pelos protestos na Ucrânia. A pergunta que fica, no entanto, é: interessa à União Europeia?
*Carlos Gustavo Poggio Teixeira é professor do departamento de relações internacionais da PUC-SP, e vice-coordenador do curso de relações internacionais da PUC-SP
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