O Sociedade Harmonia de Tênis, tradicional e restrito clube esportivo e social de elite paulistana localizado no Jardim América, bairro nobre de São Paulo, lançou um manual sobre como devem ser as vestimentas e comportamentos das funcionárias domésticas e motoristas dos sócios quando estes estiverem nas dependências do clube. Ao informar sobre as normas, o clube frisou que todas elas foram feitas em comum acordo com os associados.
Entre as regras, que incluem a proibição de que as babás acessem os restaurantes do clube desacompanhadas e restringem os espaços onde podem fazer refeições e esperar as crianças enquanto brincam, quero comentar as que versam sobre a vestimenta da babá: exigência de uso da cor branca e, se ela optar por calça legging, deve vestir camiseta ou camisa com comprimento até os joelhos.
Até onde eu sei, o clube não faz restrições quanto às sócias usarem legging nas dependência do clube. Tampouco tem restrições sobre as sócias mostrarem o contorno de seus traseiros, gordos ou magros, flácidos ou duros. O problema parece ser o traseiro das babás. Por quê?
O cerne da questão me parece ser classe social e raça, e as ideias que parte da elite brasileira faz disso. As babás geralmente são jovens e pobres, e neste sentido, muitos dos sócios devem intuir que estas meninas querem se dar bem, usando os seus corpos como instrumento sexual para catar os “ingênuos” homens ricos do clube, entenda-se: os maridos safados das sócias. Também deve rolar alguma inveja, consciente ou não, sobre os corpos jovens das babás em comparação com os corpos das sócias. A cor branca da roupa é para fixar, e deixar bem marcado para todos, que aquela pessoa é uma serviçal da linha mais baixa da cadeia de importância social, contraditoriamente, mesmo que com função tão importante quanto a de cuidar dos pimpolhos dos sócios.
A justificativa dada para as regras é a segurança; para diferenciar os sócios dos não sócios nas dependências do clube. Bem, o clube poderia resolver esta questão com o velho e conhecido crachá. O tipo de vestimenta dos funcionários domésticos ficaria por conta e risco dos próprios sócios.
Reprodução / Babás
Filme "Babás" (2010), de Consuelo Lins
Alguém poderia rebater argumentando sobre tantas outras profissões com uso obrigatório de uniformes. “Seria um demérito as babás precisarem?”
Mas será que um sócio que convide um amigo médico para uma partida de tênis precisará cuidar para que ele circule nas dependências do clube vestido de branco e com um estetoscópio no pescoço? Esse médico convidado, endinheirado e branco, também seria, afinal, um “estranho” ao clube, motivando as preocupações de segurança. A menos que, endinheirado e branco, não motive preocupação alguma.
Uma coisa é certa. Este caso diz muito sobre como parte da nossa elite é estúpida e mostra de novo que, se o Brasil depender dela para evoluir, continuará para trás.