A frente ampla é um desejo de todos os que querem construir a luta antifascista. Não tenho dúvida que os antifascistas unidos formam os 70 porcento da hashtag criada pelo Eduardo Moreira. Mas como chegar lá?
Entre os não-petistas, há uma certa unanimidade de que só há um caminho: apagar a liderança de Lula e encontrar um caminho sem o PT. Afinal, se o antipetismo elegeu Bolsonaro, eliminando o PT, o Bolsonarismo ruiria.
Infelizmente, não é assim que as coisas funcionam. Se é verdade que o antipetismo elegeu Bolsonaro, para vencer Bolsonaro não temos de eliminar o PT, mas, surpresa, o antipetismo.
É por isso que o manifesto #juntos, por mais bem intencionado que seja, não funcionará, assim como em 2019 não resultou em nada o #DireitosJá.
Se queremos de fato derrotar Bolsonaro, precisamos de uma frente que encare o antipetismo como um erro. Se vocês que admiram Churchill, que era um feroz anticomunista antes da guerra, e Roosevelt, que tinha enorme admiração por Stálin, mas conduzia um país que já perseguia comunistas antes de 1939, sugiro que se espelhem neles.
Assistam aos documentários que os Estados Unidos produziram para passar nos cinemas durante a Segunda Guerra Mundial. Vejam como eles tratavam a União Soviética. Para você que é de direita, ali está o segredo de como construir uma aliança antifascista com a esquerda.
Mas voltemos ao Brasil e a este texto, que é dirigido a não petistas que querem construir a frente ampla.
A primeira coisa a reconhecer é que o programa petista seduziu mais gente que os demais programas. Foi Haddad quem chegou ao segundo turno, não foi Marina, não foi Alckmin, não foi Ciro. Se Haddad não tinha forças para vencer Bolsonaro e talvez Ciro tivesse (duvido, mas minha opinião não vem ao caso), o eleitor de Ciro, Alckmin e Marina precisa aceitar que não dá para jogar todo o eleitorado petista numa posição de aceitar o programa do Alckmin (expresso no texto do #juntos). Esse é o caminho não para juntar 70 porcento, mas para juntar 7 porcento.
Outra coisa: observe os movimentos do PT em ceder o que hoje tá na moda chamar de protagonismos – as lideranças da oposição na Câmara e no Senado não são do PT, embora o partido tenha mais parlamentares; o PT tem evitado ser a linha da frente de pedidos de impeachment, abrindo espaço para outros partidos; o PT sinalizou apoio ao PSOL no Rio e em vários outros Estados, e no segundo tuno de 2018 chegou a apoiar gente que defendia Lula na cadeia.
Reconheça: o PT já cedeu bastante. Se quiser ser ainda mais generoso, diga: o PT já fez bastante autocrítica.
Onde está parando a Frente Ampla? Está parando num centro e numa direita que insistem em defender o programa econômico de Paulo Guedes, ou seja, o de Bolsonaro. Está parando num centro ou numa direita que gosta de chamar a presidenta do PT de Narizinho; está parando no centro ou na direita que acha que Sérgio Moro ainda está vivo, e não entubado, respirando por aparelhos, sem grandes perspectivas de sobrevida.
Bolsonaro nada de braçada porque os antifascistas de centro e direita querem um governo Bolsonaro sem Bolsonaro.
Planalto
Onde está parando a Frente Ampla? Num centro e numa direita que insistem em defender o programa econômico de Guedes, ou seja, o de Bolsonaro
Sinceramente, não vai rolar.
Se queremos a Frente Ampla, centro e direita precisam apresentar nomes e posturas dignas de um Teotônio Vilella, que virou as costas para a Arena e passou a defender os comunistas perseguidos pela ditadura; que peitava os aliados de ontem para defender a anistia hoje; que articulava atos contra o aliado de ontem sem expulsar os militantes dos partidos e grupos clandestinos, trotskistas e stalinistas e punks da Freguesia do Ó dos atos políticos que organizava.
Sábado, um dia depois da publicação do #juntos, houve um incrível ato de coragem das torcidas organizadas em defesa da democracia, puxado pela Democracia Corintiana, pelo Porcomunas e pela Gaviões da Fiel, que levou de fato a massa dos participantes.
Como não é segredo, a manifestação foi duramente reprimida pela polícia, para proteger os bolsonaristas de sempre. Não se viu o #juntos fazer nada, ir para a TV e protestar. Ao mesmo tempo, a GloboNews, patrocinadora oficial do #juntos, organizou debates no domingo inteiro sem convidar parlamentares do PT, que é o maior partido do Congresso.
Não se engane, centrista e direitista: Lula não tem opção, ele precisa e quer ter vocês na luta antifascista que vem travando há anos, tentando barrar o impeachment de Dilma na negociação (cometendo erros enormes, como apoiar a política econômica de Aécio em 2015) e nas ruas, sendo preso, resistindo sem romper com as instituições, aceitando o silêncio escandaloso em 2018 durante a campanha de Haddad etc.
Lula e o PT já cederam pacas. Haddad até assinou esse documento inócuo e ineficaz.
Está na hora de o centro e a direita cederem também. Se são antifascistas mesmo, têm de estar dispostos a aceitar os 40% de esquerdistas que querem marchar com vocês.
Como observou Lula, corretamente, a luta antifascista tem de ser contra a política do governo Bolsonaro. Ela tem de interessar aos trabalhadores. Tem de falar dos seus direitos, a maioria deles conquistados em períodos anteriores aos governos Lula e Dilma, que estão sendo moídos por Guedes-Granada-no-Bolso-do-Inimigo e Bolsonaro.
Se vocês são contra esse programa, ok. Mas não tentem, a pretexto de construir a frente antifascista, impor o de vocês. Primeiro a gente marcha junto. Depois a gente vê em quem os eleitores querem votar.