O bairro de Brixton, no sul de Londres, não costuma entrar nos guias turísticos da cidade. A fama da região tem outros motivos: considerada uma das mais pobres e violentas da capital britânica, foi palco de protestos históricos contra a discriminação racial em 1981, quando milhares de jovens negros entraram em confronto com a polícia, colocando a área no centro da luta contra o racismo no mundo. Mas a região atravessa no momento um curioso processo de revitalização, que tem atraído visitantes que não costumavam se deslocar até a última estação da linha Victoria do metrô. O fenômeno é descrito como gentrificação (ou a “elitização”) da vizinhança. Em outras palavras: Brixton virou moda.
Marina Novaes/Opera Mundi
Brixton virou “moda” em Londres e tem atraído visitantes incomuns, o que gera preocupação sobre a elitização na vizinhança
Conhecida como a “pequena Jamaica” dentro de Londres, Brixton integra o distrito de Lambeth e é a casa de boa parte da comunidade de origem afro-caribenha. É também o bairro onde nasceu o músico David Bowie e a região em que o artista plástico Vincent Van Gogh escolheu viver durante sua temporada em Londres (1873-1874) – há até uma rua em sua homenagem. Mais recentemente, em 2011, Brixton voltou às capas dos jornais ao engrossar as manifestações contra a morte do jovem negro Mark Duggan, de 29 anos, ocorrida após uma perseguição policial na região de Tottenham, no norte de Londres. E, em 2013, voltou a ser notícia ao comemorar com champanhe e festa a morte da ex-primeira-ministra Margaret Tatcher (1979-1990).
Logo na saída da estação de metrô que leva o nome da região, o som do reggae, as madeixas com dreadlocks e os pôsteres com fotos de Bob Marley e Usain Bolt evidenciam as raízes da cultura local. A poucos metros da estação e sob os trilhos do metrô, fica o Brixton Market, mercado local que mistura lojas de acessórios, perucas e roupas coloridas e exuberantes, com as bancas de temperos e condimentos, além de peixes, carnes e vegetais e frutas frescas.
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Brixton Market mistura, além de produtos de origens diversas, a cultura britânica com a africana e a caribenha
O mercado, que se espalha pelas ruas da região, existe desde meados de 1870, mas foram os restaurantes mais recentes, que ficam em Brixton Village, os grandes “culpados” pela onda de turistas na região. Seus cerca de 20 estabelecimentos, entre cafés e restaurantes de chefs famosos com culinárias de diversos países, atraíram a atenção de guias locais e fizeram com que o local passasse a “rivalizar” com outros mercados tradicionais londrinos, como o Borough Market (centro) e o Brick Lane (zona leste) – estes sim, sempre presentes nos guias de viagem.
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Outros destaques do bairro são: a cena noturna, pois Brixton concentra diversos clubes famosos; o Ritzy Cinema, um dos mais antigos de Londres, fundado em 1911; as lojas de roupas espalhadas pela Brixton Road, que fazem da região uma referência em moda “alternativa”; e o O2 Academy – antigamente chamado de Brixton Fair Deal -, palco de diversos shows, dos Sex Pistols ao The Clash – banda que compôs uma música sobre o bairro, “The Guns of Brixton” (as armas de Brixton).
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O lado bucólico da região fica por conta dos Jardins de Windmill, onde fica o último moinho de vento da capital britânica: o Brixton Windmill, construído em 1917, localizado a poucos quarteirões do metrô (a entrada gratuita). Já os murais com grafite colocaram a região na lista de passeios obrigatórios para quem gosta desse estilo de arte de rua.
Elitização preocupa moradores
Mas se por um lado parte dos britânicos comemoram a “descoberta” de Brixton, por outro, moradores reclamam que a “elitização” da região tem forçado muitos comerciantes locais a fecharem as portas. Isso porque chefs famosos têm oferecido valores altos para poder se instalar no Brixton Market. Como a administração do mercado é privada, a procura forçou o aumento dos preços para alugar um ponto e, com isso, muitos restaurantes familiares e tradicionais fecharam nos últimos anos.
[Ritzy Cinema, fundado em 1911]
Em entrevista ao jornal The Guardian, no final do ano passado, o escritor britânico Alex Wheatle, autor do livro “Brixton Rock” e cuja família é de origem jamaicana, elogiou o processo de melhoria e revitalização do bairro, mas lamentou a gentrificação, apontando que muitos moradores têm preferido se mudar, por não conseguirem viver com os preços dos imóveis e o custo de vida local. “Tudo está diferente hoje”, disse.
A região também tem sido uma das mais afetadas pela especulação imobiliária. Estima-se que o preço médio de uma casa em Londres tenha subido 94% na última década, sendo Brixton um dos bairros com a maior procura por imóveis, por ser quase central (fica na zona 2 da cidade) e ter uma rede de transportes adequada.
Não à toa, o mercado foi alvo de um protesto em outubro de 2013, quando foi inaugurado um restaurante de queijos e vinhos. Com faixas e cartazes com a frase “Yuppies Out”, moradores pediam a saída dos “yuppies” e da “elite” que tem se mudado para o bairro. O movimento continua como forma de protesto online.