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20 Minutos

Clarice Ferraz: privatização da Eletrobras põe em risco toda a economia brasileira

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Economista critica financeirização do setor elétrico e fala sobre aumento imprevisível nas tarifas e riscos geopolíticos; veja vídeo na íntegra

Pedro Alexandre Sanches

São Paulo (Brasil)
2022-06-16T19:30:00.000Z

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A privatização da Eletrobras foi o tema do 20 MINUTOS ENTREVISTA desta quinta-feira (16/06), com Clarice Ferraz, especialista nas áreas de economia de energia, regulação políticas públicas energéticas e estudos de fontes renováveis. 

Para ela, a privatização do setor energético e o desmonte de um sistema nacionalmente interligado colocam em risco toda a economia brasileira, com potencial de gerar inflação, desindustrialização e efeitos sobre todos os setores econômicos. “Está todo mundo muito chocado com a tarifa, mas o aumento do preço da carne, a inflação, tudo é causado pelo preço da eletricidade. A inflação da energia se propaga por toda a economia”, afirmou. 

A privatização deve elevar tarifas a preços imprevisíveis, em sua avaliação: “estão fazendo o comprovadamente errado, que é vender uma empresa às vésperas de uma reorganização das regras do jogo. Quando a gente fala que a tarifa vai aumentar 20%, é com as regras de hoje. No novo regime ninguém sabe, o aumento pode ser de 30%, 40%”. 

Ferraz observou que, desde o início da abertura do sistema por Fernando Henrique Cardoso, o aumento da eletricidade residencial acima da inflação é de 74%, e da indústria, 174%. Uma das consequências, disse, foi a desindustrialização acelerada do país, já que a meta é fazer caixa para governos, e não fortalecer o papel estratégico da Eletrobrás para o Brasil.

A diretora do Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Elétrico Ilumina) criticou a transação de privatização, classificando como “opaca” em oposição à transparência sempre apregoada por empresas do setor.

“A Eletrobras foi vendida e a gente não sabe quem é o dono. É um escândalo não sabermos quem participou do butim na venda da maior empresa de eletricidade da América Latina. Quando a gente souber, vai saber quem estava puxando essa corda”, disse.

Os casos da hidrelétrica Itaipu Binacional e da Eletrobras Eletronuclear, empresa de economia mista que opera usinas termoelétricas, têm o potencial de causar instabilidade geopolítica, defende a pesquisadora. “Não houve uma palavra do Itamaraty sobre um acordo que é internacional. Há uma enorme confusão em torno de Itaipu, e não estão nem aí. Criam conflito geopolítico, quebram regras, não ligam para o que pode acontecer na Justiça no ano que vem", afirmou Ferraz.

A economista lembra que, legalmente, nenhuma das duas empresas é privatizável: a Eletronuclear por se tratar de setor de segurança nacional e a Itaipu, porque envolve um tratado binacional sem data de prescrição. “Provavelmente os investidores vão querer se livrar da Eletronuclear e, se eles saírem, acabou o programa nuclear brasileiro”, prevê.

Reprodução
Ferraz comentou sobre aumento imprevisível nas tarifas e riscos geopolíticos das privatizações

Também programas democratizantes do setor elétrico, como o Luz para Todos, ficarão inviabilizados na prática pela privatização da Eletrobras. “Vai acabar. Não vai haver interesse das empresas privadas, porque não dá lucro, ao contrário”, disse. Em termos logísticos, afirma, os custos aumentam cada vez mais à medida que se pretenda levar energia aos brasileiros mais isolados e com menor poder aquisitivo. 

Para ela, o Brasil teve ganhos extraordinários ao construir um sistema interligado, o que faz o país compartilhar riscos, mas também sua abundância energética natural. O modelo foi construído para funcionar à base de matrizes renováveis, na época hidrelétricas, hoje também eólicas e solares. 

A cadeia de energia eólica, formulada durante os governos petistas, partiu do zero para representar 13% da matriz energética do país em duas décadas. É a segunda energia mais barata, mas a expansão não corresponde à utilização efetiva, o que colabora para elevar as tarifas: "no Brasil os pequenos assumem tudo, enquanto os investidores não perderam 1% de seus dividendos".

Indústria da eletricidade

Resumindo a história do setor energético no Brasil, a especialista explicou que o desenvolvimento do país dependeu da saída do modelo inicial, de empresas privadas fornecedoras de eletricidade (como a Light), para a estatização proposta por Getúlio Vargas em 1954 e efetivada em 1961. 

A evolução de país agrário subdesenvolvido para industrializado não aconteceria sob um modelo que travava o crescimento, segundo ela. “A intervenção estatal vem para suplementar e tirar o capital privado, que é insuficiente, vive daquela renda e não tem nenhuma preocupação com os propósitos do setor elétrico", disse.

Iniciada em 1995 pelo governo tucano, a primeira reforma liberalizante ficou inconclusa, em meio a apagões, crises de abastecimento e racionamento, e é retomada agora sob Bolsonaro. “Saem privatizando porque querem dinheiro e o setor elétrico, deixa para lá. Só que quando se deixa para lá, um país inteiro pode colapsar”, observou Clarice.

Comentando apagões recentes no estado do Amapá e no Texas, nos Estados Unidos, ela criticou a contratação de termelétricas pelo governo Bolsonaro, classificando o gás como "o cerne” do conflito mundial na Ucrânia, "a energia da guerra, cara e poluente”. 

Para ela, a substituição, pela Alemanha, do gás barato obtido da Rússia pelo “gás da democracia” norte-americana corresponde ao ocaso de uma potência industrial. “Se acabar a energia barata, vai acabar a indústria da Alemanha. A Europa subjugada pelos Estados Unidos é difícil de entender. Qualquer suicídio energético se traduz em suicídio econômico”, concluiu.

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Análise

Patentes na OMC é uma derrota para os países do Sul Global

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Pandemia de covid-19 reativou a debate sobre a quebra de patentes para medicamentos e vacinas. Apesar de sua união em torno do tema, países subdesenvolvidos sofreram uma derrota

Alessandra Monterastelli

Outras Palavras Outras Palavras

2022-07-06T22:35:00.000Z

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No dia 17 de junho, saiu fumaça branca das chaminés da Organização Mundial do Comércio (OMC). A entidade, responsável pela regulação de patentes internacionais, anunciou que chegara a uma conclusão sobre as vacinas contra o coronavírus. Tratava-se do pedido de isenção do acordo TRIPS – sigla em inglês para Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Firmado na virada do século, tal compromisso obriga os países-membros da OMC a adotar padrões mais rigorosos de proteção patentária. Consequentemente, encarece o acesso às inovações tecnológicas, inclusive no setor farmacêutico. Mas a decisão final foi amplamente criticada por ativistas da saúde e movimentos populares em todo o mundo, já que a OMC rejeitou a isenção total do TRIPS. 

Em 2020, diante da disseminação do novo coronavírus, África do Sul e Índia protocolaram a proposta de isenção do Acordo, que obteve amplo apoio dos países em desenvolvimento e de baixa renda – com exceção do Brasil. A nova decisão foi saudada pelo Secretariado da OMC e por representantes de países ricos como um resultado sem precedentes, mas ativistas condenam que, na prática, a decisão não atende as necessidades mínimas da maior fatia do mundo. “Houve um esvaziamento da proposta pelos países mais ricos. O texto perdeu totalmente sua força, não trouxe nada novo”, explica Felipe Carvalho, Coordenador Regional da Campanha de Acesso do Médicos Sem Fronteiras ao Outra Saúde.

A conclusão do órgão concedeu uma exceção temporária à restrição das quantidades de vacinas que podem ser exportadas sob licença compulsória; diagnósticos e tratamentos não estão incluídos e devem obedecer ao limite de exportação durante o tempo de licença compulsória – decretada durante emergências sanitárias, como é o caso da pandemia. Além disso, a concessão vale apenas para responder à covid-19 e não tem validade diante de outras crises de saúde. O acordo final não inclui o compartilhamento de segredos comerciais e know-how de fabricação, o que prejudicará a produção de vacinas com tecnologia avançada por países de baixa renda – como é o caso dos imunizantes de RNA.

Carvalho conta que o problema é abordado com frequência em reuniões escpecais da OMS e da ONU.  “Existe um consenso entre especialistas e órgãos multilaterais de que as patentes causam constantes crises de acesso e inovação na saúde”. Em maio, o The Guardian divulgou que a Pfizer lucrou 25,7 bilhões de dólares só no início de 2022 – mais da metade do valor está relacionado à venda de vacinas contra a covid-19. Tim Bierley, ativista do Global Justice Now, denunciou ao jornal britânico que apesar do apelo da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de outras organizações, a farmacêutica seguia se recusando a compartilhar a tecnologia de produção do imunizante. O diretor da OMS, Tedros Adhanon, afirmou em 2021 que a pandemia estava sendo prolongada por uma “escandalosa desigualdade” diante do acúmulo de doses de imunizantes por países ricos enquanto países pobres não conseguiam avançar em sua meta de vacinação em massa. 

“Desde a criação do acordo TRIPs nós temos um cenário de constantes crises de acesso a medicamentos essenciais”, conta Felipe. Ele relembra o caso emblemático da epidemia de HIV/AIDS, na década de 1990. “Em 1996 surgiu a primeira terapia para a doença. As pessoas pararam de morrer e passaram a conviver com o vírus. Mas essa terapia não chegou nos países onde o cenário era mais grave”, explica. O ano de 1996 foi também quando o acordo TRIPS entrou em vigor, após sua criação em 1994 e preparação em 1995. “A partir daí se criou uma coalizão na sociedade civil, da qual fazemos parte, chamada Movimento de Luta pelo Acesso a Medicamentos. A pergunta era: por que os preços eram tão altos e o tratamento se tornava inacessível para milhões de pessoas? Nos aprofundamos no sistema de patentes e entendemos que o monopólio era a causa”, relembra.

Apesar do TRIPS possuir cláusulas que permitem flexibilizações, elas são de difícil utilização devido a dois fatores principais: sua não-incorporação completa em leis de países-membros e a pressão que as farmacêuticas exercem sobre as decisões da OMC. Na década de 1990, diante da grave situação vivida na África do Sul – país com maior número de mortes pela AIDS na época – o governo então liderado por Nelson Mandela aprovou uma das medidas previstas no TRIPS para importar genéricos. Na ocasião, Mandela sofreu o processo de 39 farmacêuticas que se opuseram à decisão tomada para conter a crise de saúde pública. Apesar da derrota das corporações na justiça, “esse é um exemplo de como essas empresas e seus países-sede tentam barrar as normas legítimas existentes no TRIPS”, exemplifica Carvalho.

A OMC é uma instituição formada por 164 membros e opera com base na tomada de decisões por consenso. “A OMC falhou em fornecer uma isenção. O acordo coloca os lucros à frente das vidas e mostra que o atual regime de propriedade intelectual falha em proteger a saúde e promover a transferência de tecnologia. Essa não-renúncia estabelece um mau precedente para futuras pandemias e continuará a colocar vidas em risco” declarou Lauren Paremoer, médica e integrante do Peoples’ Health Movement na África do Sul. 

A Health Action International, referência no trabalho para expandir o acesso a medicamentos essenciais, argumentou em nota que a decisão da OMC impõe obstáculos ao licenciamento compulsório, uma das poucas flexibilidades existentes no TRIPS, em troca de uma abertura tímida para a facilitação da exportação de vacinas. Outras entidades representantes da sociedade civil já denunciaram a atuação dos países ricos e vêm aumentando a pressão sobre os governos. O objetivo, segundo seus porta-vozes, é que sejam tomadas medidas concretas para desafiar as regras de monopólio farmacêutico da OMC e garantir mais acesso a medicamentos e tecnologias. 

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