A menos de quinze dias do primeiro turno das eleições presidenciais francesas, o governo é alvo de fortes críticas provocadas pelo aumento do número de contratos fechados com consultorias privadas. Entre elas, a empresa americana McKinsey, suspeita de não ter pago imposto na França nos últimos dez anos. Nesta quarta-feira (30/03), o governo assegurou que “não tem nada para esconder”, e denunciou o “uso político” da situação.
A comissão de inquérito aberta no Senado para investigar o caso acusa o governo francês de “minimizar a influência dos consultores”. Os parlamentares da casa, composta principalmente por integrantes do partido de direita Os Republicanos, revelaram no dia 17 de março o aumento de contratos fechados pelo Executivo com diversas consultorias privadas, desde 2018.
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O gabinete do primeiro-ministro, Jean Castex, teria gasto quase € 900 milhões (R$ 4,767 bilhões) pelo serviço de consultorias – quase três vezes mais em quatro anos. O relatório acusa as filiais francesas da McKinsey de otimização fiscal nos contratos. Desta forma, a empresa teria ficado isenta dos impostos aplicados sobre os lucros, entre 2011 e 2020.
Questionado nesta quarta-feira sobre o caso, o ministro da Economia, Bruno Le Maire, afirmou que o governo não tinha que receber “lições de moral em termos de luta contra a otimização fiscal” e que o pagamento dos impostos pela consultoria americana seria verificado.
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“Sabemos que as empresas internacionais lucram na França. A McKinsey pagará todos os impostos que deve ao país”, afirmou. Em um comunicado, a consultoria americana MicKinsey assegurou “respeitar as regras fiscais” e ter pago os impostos nos anos “em que registrou lucro na França.”
Macron perde votos
A polêmica repercute nas intenções de votos. Uma pesquisa de opinião publicada pela empresa Elabe, nesta quarta-feira, mostrou uma diminuição da diferença entre o presidente francês, que tenta a reeleição, e a candidata do Reunião Nacional, Marine Le Pen, no segundo turno das eleições.
Dati Bendo/Comissão Europeia
Campanha de Macron precisou responder sobre consultorias milionárias contratadas pelo governo
As projeções ainda apontam para a vitória de Macron, com 52,5% dos votos, contra 47,5% para Le Pen, mas a diferença entre os dois vem diminuindo. Segundo dados divulgados na semana passada, o chefe de Estado venceria com 56% dos votos. A candidata da extrema direita teria 44%.
Uma das explicações é que o escândalo reavivou a imagem de “presidente dos ricos” que Macron ganhou no início do mandato, em 2017, após várias demonstrações que tiveram impacto na opinião pública. Uma das mais emblemáticas foi quando ele sugeriu a um jovem horticultor desempregado que “bastava atravessar a rua para achar trabalho nos restaurantes.”
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Na tentativa de minimizar a polêmica, o ministro do Orçamento, Olivier Dussopt, e a ministra da Transformação e da Função Pública, Amélie Montchalin, deram uma entrevista coletiva de imprensa para esclarecer questões sobre os contratos. De acordo com ela, “as consultorias não decidem nenhuma reforma do Estado”. Segundo os ministros franceses, o recurso às consultorias é uma prática “habitual” e “útil” na maioria dos casos.
Os documentos obtidos pela comissão do Senado também mostram que a McKinsey teria sido consultada para avaliar a polêmica reforma da Previdência francesa, que modificará a idade mínima da aposentadoria para 65 anos em vez de 62. A McKinsey também teria sido consultada pelo Ministério da Educação para avaliar a evolução da carreira dos professores e auxílio-moradia.
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A senadora Eliane Assassi, do Partido Comunista Francês, disse à rádio francesa France Info que a consultoria americana cobrou € 950 mil (R$ 5 milhões) por um documento de 50 páginas. “Sabemos da existência desse documento em PowerPoint, o que mostra que o preço por página saiu meio caro”, alfinetou. A oposição pede que o governo dê uma explicação “clara” sobre a natureza dos contratos.
A polêmica também invadiu as redes sociais, onde Macron é acusado de favorecer interesses privados. O presidente já se justificou duas vezes em público. Na última vez, no domingo, sem esconder sua irritação, ele afirmou que, “se existem provas de manipulação, cabe à Justiça Penal avaliar”, negando que haja “esquemas” favorecendo a consultoria americana.