Após a derrota de Waterloo em 18 de junho de 1815, Napoleão foi imediatamente à Paris. No Palácio do Eliseu reuniu o Conselho de Ministros a fim de decretar que ‘a Pátria está em perigo’.
Porém, o imperador compreendeu que a partida estava perdida e que não poderia abdicar pela segunda vez em favor de seu filho. Retirou-se para Malmaison com uma parte de seus fiéis.
Encurralado pelas potências inimigas, que já miravam seus canhões para as cercanias de sua casa, o Imperador viajou a Rochefort onde permaneceu por alguns dias, aguardando os passaportes do governo provisório a fim de se isolar na ilha de Aix.
Rapidamente a corte dos exilados percebeu que o chefe de governo, Fouché, os havia enganado. Depois de estudar todas as possibilidades de fuga, Napoleão decidiu se render e confiar seu destino ao príncipe regente da Inglaterra.
Em 15 de julho de 1815, o imperador foi levado a bordo da corveta Bellerophon. Lá seria severamente recriminado pelo almirantado inglês, pois após seu retorno da ilha de Elba, o Congresso de Viena lhe havia retirado todos os seus títulos e o classificado como sendo “perturbador da paz no mundo e inimigo do gênero humano”.
Em 31 de julho tomou conhecimento de sua deportação para a ilha de Santa Helena e em 7 de agosto foi transferido a bordo do Northumberland que o conduziria ao seu lugar de exílio.
A longa viagem terminou em 15 de outubro de 1815. Napoleão, que se encontrava na proa do navio, exclamou: “Santa Helena, não será uma bela temporada”. A partir de 1818 e a pedido do ex-imperador, os ingleses autorizaram a vinda dos abades Buonavita e Vignali, bem como do médico Antommarchi.
A vigilância do prisioneiro foi confiada ao almirante Cockburn e ao governador Wilks, que seria substituído em 1816 pelo terrível Hudson Lowe. Três mil soldados formavam a tropa. Um círculo de 8 quilômetros de diâmetro foi traçado em torno de Longwood.
Nas colinas ao redor, havia sentinelas. Em torno da ilha, 4 navios de guerra se revezavam a fim de impedir qualquer desembarque ou toda tentativa de fuga. Situada a 2 mil quilômetros da costa africana e a 2.9 mil quilômetros da costa brasileira, Santa Helena tem 17 quilômetros de comprimento, 10 de largura e está perdida em meio ao Atlântico Sul.
A monotonia do tempo e do clima criava uma mediocridade de existência. Um ambiente de morosidade se instalava apesar dos esforços de Napoleão para diversificar as jornadas. Mudava os horários das refeições, dos passeios e do descanso.
Paola Orlovas
Em 15 de julho de 1815, o imperador foi levado a bordo da corveta Bellerophon
À noite, havia muitas vezes um grande jantar, à moda das Tuileries. Acendiam-se todos os lustres do salão, os exilados vestiam as suas melhores roupas, alguns homens em trajes militares, as mulheres em vestidos decotados. A despeito dos esforços, da mesa farta, as noitadas eram tristes. Por vezes, madame de Montholon se colocava ao piano e cantava árias de Paesiello ou de Cimarosa.
Intimamente persuadido que iria terminar sua vida nesta ilha, queria convencer os ingleses que não era somente o general Bonaparte, mas que ficaria para a posteridade como o Imperador Napoleão I.
Em abril de 1816 a esperança renasceu: o almirante Cockburn seria substituído pelo general Hudson Lowe. Napoleão pensou que se daria melhor com um artilheiro do que com um marinheiro. A esperança não passou de fogo de palha. Lowe era o personagem para se tornar um carcereiro: meticuloso, vaidoso, rígido, detalhista. O ambiente entre os dois se deteriorou celeremente. Faltando-lhe totalmente a psicologia, tornou impossível a vida de todos os residentes de Longwood.
As restrições impostas acabariam de fechar as portas de Longwood a todos os visitantes estrangeiros. Isto levou a uma lenta degradação física de Napoleão, que praticamente não saia de sua residência.
Em 1820, a conselho de seu médico, fazia trabalhos de jardinagem e outros afazeres domésticos. Não obstante, a partir do outono sua saúde declinou e em abril de 1821 era visível a piora. Começa uma agonia que levaria 40 dias em meio a dolorosos sofrimentos.
Napoleão se recusava a ser examinado pelos médicos ingleses e toda a responsabilidade recaiu sobre o doutor Antommarchi, que buscou seu colega inglês Arnott para juntos prescreverem o tratamento e os cuidados. Foi receitado o calomelano – cloreto mercuroso usado como purgativo e anti-sifilítico – a fim de aumentar a secreção biliar.
A partir de abril, o imperador não mais deixava o leito, de onde redigiu seu breve testamento: “Hoje, 15 de abril de 1821, em Longwood, ilha de Santa Helena. Eis meu testamento ou ato de última vontade: 1º – Morro na religião apostólica romana no meio da qual nasci há mais de 50 anos; 2º – Desejo que minhas cinzas repousem às margens do Sena em meio a este povo francês que eu tanto amei”.
Em 5 de maio, Lowe foi alertado pelo doutor Arnott que o fim estava próximo. Todos estavam ao pé do leito de morte, lembrando-se do grande homem e de sua imortal epopéia. Napoleão exalou seu derradeiro suspiro. Eram 17h51.
No dia seguinte, em presença de médicos ingleses, Antommarchi fez a autópsia: morreu de úlcera, provavelmente cancerosa, do estômago, aos 51 anos. Seus restos seriam depositados numa laje funerária anônima até 1840, quando o rei Louis-Philippe obteve autorização do governo inglês para repatriar seu corpo. É no Palácio dos Inválidos, em Paris, às margens do Sena, ao lado de seu povo, que repousa para sempre.
(*) A série Hoje na História foi concebida e escrita pelo advogado e jornalista Max Altman, falecido em 2016.