Morre em Amsterdã em 1º de agosto de 1990, o sociólogo Norbert Elias aos 93 anos. De família judaica, ele teve de fugir da Alemanha nazista e se exilou em 1933 na França, antes de se estabelecer na Inglaterra, onde passaria grande parte de sua carreira.
No entanto, seus trabalhos em alemão tardaram a ser reconhecidos e ele viveu de forma precária em Londres antes de obter em 1954 um posto de professor na Universidade de Leicester.
Suas obras focaram a relação entre poder, comportamento, emoção e conhecimento na História. Elias permaneceu durante um longo período como autor marginal, tendo sido redescoberto por uma nova geração de teóricos nos anos 1970, quando se tornou um dos mais influentes sociólogos de todos os tempos.
A tardia popularidade pode ser atribuída a sua concepção de grandes redes sociais, que encontrou aplicação nas sociedades ocidentais pós-modernas, onde a presença da ação individual não pode ser negligenciada. A exagerada ênfase em vigor na estrutura sobre o indivíduo começava a ser duramente criticada.
A obra mais importante de Elias foram os dois volumes de O Processo Civilizatório. Originalmente publicado em 1939, foi virtualmente ignorado até sua reedição em 1969, quando o primeiro volume foi traduzido ao inglês. Nele, são traçados os acontecimentos históricos do habitus europeu, ou “segunda natureza”, ou seja, a estrutura psíquica individual moldada pelas atitudes sociais.
Elias demonstrou como os padrões europeus pós-medievais de violência, comportamento sexual, funções corporais, etiqueta à mesa e formas de discurso foram gradualmente transformados pelo crescente domínio da vergonha e do nojo, atuando para fora de um núcleo cortesão, a etiqueta.
O autocontrole era cada vez mais imposto por uma rede complexa de conexões sociais desenvolvidas por uma autopercepção psicológica que Freud cunhou de “super-ego”. O segundo volume aborda as causas destes processos e os reconhece nas cada vez mais centralizadas e diferenciadas interconexões na sociedade.
Quando a obra de Elias foi acolhida por setores da intelectualidade, inicialmente sua análise do processo social foi mal compreendida e tomada como uma forma de darwinismo social. Está ideia foi deixada de lado e sua obra foi entendida a partir de uma outra chave de pensamento sobre o processo social.
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Norbert Elias, sociólogo de família judaica, que teve que fugir da Alemanha nazista
A teoria sociológica formulada por Elias pode ser considerada uma abordagem de caráter crítico, cujos conceitos fundamentais foram construídos a partir da identificação das deficiências e limitações de perspectivas teóricas consideradas clássicas pelas ciências sociais, associadas, sobretudo, ao funcionalismo parsoniano (do sociólogo norte-americano Talcott Parsons) e a certas versões do estruturalismo.
Essa teoria concebe sua a tarefa de analisar os processos sociais baseados nas atividades dos indivíduos que, por meio de suas necessidades, são orientados uns para os outros e unidos uns aos outros das mais diferentes maneiras.
Teias de interdependências
Esses indivíduos constroem teias de interdependência que dão origem a configurações de muitos tipos: família, aldeia, cidade, estado, nações. O conceito de configuração pode ser aplicado onde quer que se formem conexões e teias de interdependência humana.
Elias não aceita o pressuposto de que as sociedades tenham fronteiras e limites específicos, pois as cadeias de interdependência escapam a definições abrangentes. “A complexidade de se investigar algumas configurações decorre do fato de que as cadeias de interdependência são maiores e mais diferenciadas”. Elias denomina as configurações de estruturas, mas o emprego desse termo não guarda qualquer associação com a utilização do mesmo termo pelos teóricos funcionalistas e estruturalistas.
Segundo Elias, a mudança social decorre do fato de que as cadeias de interdependência se modificam. A teoria sociológica denomina esse processo de diferenciação e integração. Elas se tornam mais complexas, e à medida que o grau de complexidade aumenta, antigas formações sociais são substituídas por uma nova. Esse é o critério para caracterizar diferentes formações sociais, que dão origem a uma nova estrutura de mentalidade.
Em seus estudos, assinala que é das teias de interdependência individuais que as coerções ou forças sociais têm origem. Ele refuta, assim, qualquer concepção de que tais forças coercitivas têm caráter objetivo acima e para além dos próprios indivíduos. Desse modo, a relação entre o indivíduo e as estruturas sociais deve ser analisada e concebida como um processo. “Estruturas sociais” e “indivíduo”, ou seja, “ego” e “sistema social” são aspectos diferentes, mas indissolúveis, cuja análise deve recair sobre as teias de interdependência humanas que formam as configurações sociais.
Elias também se preocupou em explicar as motivações que levam os indivíduos a construírem teias de interdependência, qual a gênese das disposições básicas. De acordo com a teoria sociológica, desde o início de suas vidas os homens existem em interdependência. Uma parte da teia de interdependência tem origem nas necessidades biológicas dos seres humanos, que desde os primeiros momentos necessitam dos cuidados e da atenção dos pais.
Entretanto, uma grande parte das teias de interdependência advém de necessidades recíprocas, socialmente geradas, tais como a divisão do trabalho, a competição, as ligações afetivas, entre outras.
Também nesta data:
1291 – Cantões de Uri, Schwyz e Unterwalden iniciam formação da Suíça
1834 – A escravatura é abolida no Império Britânico
1914 – Alemanha declara guerra à Rússia
1914 – Começa a Primeira Guerra Mundial
2004 – Incêndio em supermercado no Paraguai mata 464 pessoas e fere outras 409
(*) A série Hoje na História foi concebida e escrita pelo advogado e jornalista Max Altman, falecido em 2016.