Faleceu ontem, aos 65 anos, Artur Ortiz de Araújo. Vinha de uma longa enfermidade cardíaca, com meses seguidos de internação. Estava na fila para o transplante de coração. A vida, aos seus olhos, estava perdendo energia, graça e sentido.
Eu o conheci há muito tempo. Não me recordo exatamente se nosso primeiro contato foi em 1977 ou 1978. Ambos, muito jovens, éramos militantes da resistência à ditadura e participávamos intensamente do movimento estudantil. Um pouco mais velho, ele já era universitário. Eu ainda estava no ensino médio.
Logo ficamos amigos, além de camaradas. Aproximavam-nos as ideias e valores da tradição comunista, mas também a paixão por romances policiais e a literatura brasileira.
Artur, que naquela época também se chamava Otávio, tinha o dom de rir de si próprio, e de nós mesmos, o que sempre me pareceu um traço essencial de inteligência. Não é muito sério quem se leva muito a sério.
Imensamente culto e sarcástico, era capaz de ouvir os demais e repensar suas próprias certezas, apesar de afirmá-las, quase sempre, como se fossem conclusões derradeiras.
Não gostava das tarefas práticas da militância e frequentemente se desanimava com a pressão que esse tipo de missão acarreta. Ainda assim, nunca fugia de suas obrigações, mesmo que preferisse os momentos de elaboração e polêmica.
Tivemos nossas encrencas, rupturas e reconciliações. Houve momentos nos quais divergíamos e outros em que éramos quase irmãos siameses. Ao longo de cinco décadas, às vezes nos distanciamos, para nos juntarmos novamente em seguida.
Artur era um grande cozinheiro, acho até que poderia ter sido um renomado chefe. Ao redor de seus pratos, amigos se reuniam para conversar e rir.
Na trajetória profissional, depois de abandonar a engenharia na Poli, sem se formar, dedicou-se à hotelaria e ao turismo. Comandou importantes hotéis e foi diretor da Embratur, já no governo Lula, além de integrar conselhos de várias empresas e ter trabalhado na Prefeitura de Santos, na gestão de David Capistrano Filho.
Consultor sindical e analista de mão cheia, animou muitas plateias e coletivos com suas opiniões ferinas, comumente chocantes pelo realismo e assertividade.
Ultimamente trabalhava na Fundação Perseu Abramo, desempenhando várias e simultâneas tarefas, embora a condição física já fosse precária.
Por onde passou, com quem andou, invariavelmente demonstrou ser um revolucionário comprometido, um intelectual refinado, um bom camarada, um grande e solidário amigo.
Artur Ortiz de Araújo, presente. Agora e sempre!
Seu velório será nesta terça-feira (13/06) das 18h às 20h30, na avenida Pacaembu 1254, Pacaembu, São Paulo.
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