O programa OUTUBRO desta segunda-feira (02/10) discutiu a questão da Segurança Pública no Brasil e os desafios do governo de Luiz Inácio Lula da Silva em implementar uma agenda que resolva os problemas relacionados ao tema no país e também em enfrentar a hegemonia da direita, e especialmente da extrema direita, no debate público sobre ele.
Para abordar essa matéria foram convidados a acadêmica Jacqueline Sinhoretto, professora do Departamento de Sociologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), o historiador Valerio Arcary e o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu.
O programa começou discutindo a gestão do atual governo sobre a questão da segurança pública. Para Jaqueline Sinhoretto: “a pauta do 8 de janeiro acabou sequestrando um pouco do debate público sobre segurança e essa questão acabou sendo desfavorável ao governo, porque surge junto à questão da Bahia, por exemplo, com uma explosão da violência policial, embora essa explosão não tenha acontecido só na Bahia, isso tem acontecido tanto em estados alinhados ao governo quanto em estados não alinhados
“Tudo isso fez com que faltasse discutir mais sobre políticas de prevenção. Faltou também um maior orçamento, um maior poder de decisão em cima da agenda de reformas e a discussão da desmilitarização das polícias, que não entrou na pauta”, acrescentou a acadêmica.
Por sua vez, Valerio Arcary disse não estar convencido de que se trata de um problema de modelo administrativo, ou seja, que o desafio principal seja que o Ministério da Justiça deva dar lugar a um Ministério de Segurança Pública.
O historiador considera que “é preciso reconhecer o papel da Polícia Federal na gestão do Flávio Dino no enfrentamento do golpismo, a partir dos atos do dia 8 de janeiro, e também a sua intervenção na Amazônia em defesa do povo Yanomami, que estava abandonado e sujeito à invasão dos seus territórios por dezenas de milhares de garimpeiros”.
Polícia Militar do Estado de São Paulo
Segundo José Dirceu, é preciso desmistificar as polícias militares e mudar a forma de pensar o policiamento, com foco na prevenção de crimes
José Dirceu seguiu a reflexão de Arcary e disse que não se trata de discutir a gestão do Flávio Dino e sim de constatar que, no âmbito das políticas de segurança pública, não houve uma evolução no Brasil do modelo baseados na repressão militar, que ele ressalta como uma doutrina instaurada desde o Império e continua vigente até hoje. “Desde o capitão do mato até a Rota do (Paulo) Maluf”.
“Nós não evoluímos para um modelo baseado em prevenção, integração e inteligência, mas também não é verdade que não fizemos nada, porque muitos subestimam o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), mas Diadema é um exemplo e os dados são gritantes sobre a diminuição da violência desde a sua implementação”, frisou o ex-ministro da Casa Civil durante o primeiro governo de Lula.
Para Dirceu, é preciso desmistificar as polícias militares. “A maioria desses policiais fazem o que seriam as rondas ostensivas e nas últimas décadas o que se viu foi um aumento dos batalhões especiais, as Rotas e os Bopes da vida, altamente treinados e com alto poder letal de fogo, portanto para operações de guerra, pois é disso que se trata”.
O tema do encarceramento em massa também foi um ponto destacado do debate. Para Arcary, “nós temos uma tragédia humanitária no Brasil, que se chama ‘genocídio da juventude negra’. Nós estamos caminhando para ser uma das maiores populações carcerárias do mundo, diante de um país que já superou os 800 mil presos. São campos de concentração. E o mais grave é a incorporação de políticas de terceirização dos presídios”.
A socióloga Jacqueline Sinhoretto ressaltou que parte do problema está no discurso de associar os direitos humanos à defesa de bandidos, que ela considera uma particularidade brasileira.
“Em outros países, a ideia dos direitos humanos está associada com a defesa da cidadania e da democracia, mas no Brasil essa expressão foi demonizada e isso é fruto da transição política do final da ditadura”, disse a acadêmica.