A Itália pediu que o governo do Brasil execute a pena do torturador uruguaio-brasileiro Pedro Antonio Mato Narbondo, condenado em julho de 2021 à prisão perpétua pelos crimes de assassinato e desaparecimento de cidadãos italianos, ocorridos nas décadas de 1970 e 1980, no âmbito da Operação Condor.
O pedido foi assinado pelo ministro da Justiça, Carlo Nordio, e enviado ao governo brasileiro através de canais diplomáticos dia 7 de dezembro do ano passado.
O documento, ao qual Opera Mundi teve acesso com exclusividade, esclarece que “Narbondo é procurado em âmbito em internacional com base na ordem de execução emitida em 13.07.2021 pela Procuradoria Geral da República junto à Corte de Apelação de Roma, para o cumprimento da pena de prisão perpétua que lhe foi conferida em 08.07.2019, transitada em julgado em 09.07.2021.”
No documento, o governo italiano explica que o pedido de extradição de Narbondo, encaminhado ao Brasil em 29 de dezembro de 2021, foi negado devido ao artigo 5 da Constituição brasileira, que proíbe a extradição dos nacionais e que, “consequentemente, as autoridades brasileiras informaram sobre a possibilidade de solicitar com base na lei n. 13.445/2017 (Lei de Migração) a execução da pena no Brasil.”
Militar reformado do exército uruguaio, o ex-coronel adquiriu em 2003 a nacionalidade brasileira herdada da mãe, a gaúcha Argelia Narbondo Diaz. Justamente por ser brasileiro, o governo negou a sua extradição à Itália.
Como a Constituição brasileira não admite pena de morte nem prisão perpétua, se o pedido da Itália for acatado, a pena do coronel deve ser reduzida de acordo com a lei penal do Brasil.
Reprodução
Militar reformado do exército uruguaio, o ex-coronel adquiriu em 2003 a nacionalidade brasileira herdada da mãe
As vítimas de Narbondo
Conhecido como “el Burro” em seu país, pela forma brutal em que conduzia seus interrogatórios, o coronel é um dos 14 torturadores (onze uruguaios e três chilenos) condenados pelo tribunal de Roma à prisão perpétua no processo que julgou os crimes contra cidadãos italianos ocorridos durante o período da Operação condor.
A Condor foi uma rede de perseguição, tortura e assassinato de opositores políticos implementada pelas ditaduras do Cone Sul. As vítimas de Narbondo são Bernardo Arnone, Gerardo Gatti, Juan Pablo Recagno Ibarburu e María Emilia Islas Gatti de Zaffaroni.
Com 81 anos, o coronel mora em Santana do Livramento, cidade de fronteira com o Uruguai, de onde fugiu, após ter sido convocado para depor em um processo no qual é investigado pela morte de um operário em 1972.
Em agosto de 2021, após anos de silêncio, Narbondo falou com o jornal gaúcho Matinal e disse que era militar e cumpria ordens. “Vivíamos em uma época de guerrilhas nos países. Os Tupamaros no Uruguai, VAR Palmares no Brasil, o mesmo na Argentina, Chile. Então tudo o que eu disser em minha defesa, como militar, não vai adiantar. Foi um período, e aquilo tudo ficou no passado”, disse.
Ministro Flávio Dino
O governo brasileiro já deixou claro que existe a possibilidade que brasileiros condenados no exterior que tiveram o pedido de extradição negado cumpram suas penas no Brasil.
Em 18 de janeiro, durante uma entrevista à Bandnews, Flávio Dino, ministro da Justiça, citando o caso do ex-jogador Robinho — também condenado na Itália a nove anos de prisão por crime de estupro de grupo — declarou que poderia cumprir sua pena no país.
“A própria Constituição brasileira proíbe a extradição de brasileiros natos, e agora, em tese, pode haver o cumprimento de pena (no Brasil), mas é algo a ser examinado posteriormente quando isso efetivamente tramitar”, disse o ministro, que também afirmou que na sua “visão, quaisquer que sejam eles, devem ser punidos”.