Herbert von Karajan, um dos maestros de maior destaque do período pós-guerra, morre em Anif, Áustria em 16 de julho de 1989. Nascido em Salzburgo em 5 de abril de 1908, Karajan passou 35 anos à frente da Orquestra Filarmônica de Berlim. Seu estilo na regência foi marcado por perfeccionismo, intensidade e uma certa dose de exibicionismo.
Karajan moldou a Orquestra Filarmônica de Berlim para ser, talvez, o mais primoroso agrupamento de música clássica do mundo. Era um superstar entre os regentes – sua densidade, cabelos prateados e modos autoritários tornavam-no instantaneamente reconhecido no mundo da música.
O maestro tinha uma personalidade forte, que despertava controvérsia – em especial a gerada pela sua lealdade ao regime nazista no começo de sua carreira. Críticos e plateias extasiavam-se diante do brilho impecável que ele podia extrair da Filarmônica de Berlim e de outras orquestras que regeu. Todavia, outros consideravam suas interpretações excessivamente refinadas, carentes de alma e drama.
Karajan era um autócrata no podium e seu legendário perfeccionismo resultava num excitante som orquestral, porém, não encorajava novas interpretações. Vivia um estilo de vida da alta sociedade, buscando e recebendo publicidade, além de sua queda por aventura. Alguns o consideravam vaidoso e grosseiro. Seus músicos costumavam brincar que Deus aspirava um dia alcançar o nível de Karajan. No entanto, apesar das divergências de opinião que os amantes da música pudessem ter, poucos discordavam que Karajan dominou o imaginário da música clássica do século XX.
Início
O austríaco estreou como maestro em 1929, regendo Salomé de Richard Strauss em Salzburg. Exerceu até 1934 o posto de primeiro mestre-capela da Ópera do Estado de Ulm. Em 1933, faz sua estreia no Festival de Salzburg dirigindo A Noite de Walpurgis de Felix Mendelssohn. No mesmo ano apresenta um primeiro pedido de adesão ao Partido Nazista, que não chegou a ser efetivado devido a restrições no seio do partido após a chegada de Hitler ao poder.
Dois anos mais tarde, em março de 1935, filia-se finalmente com o objetivo ardentemente cobiçado de assumir a direção da orquestra sinfônica do Teatro de Aix-la-Chapelle. Era na altura o mais jovem regente a ser convidado a reger em Estocolmo, Bruxelas e Amsterdã. Em 1937, estreia à frente da Orquestra Filarmônica de Berlim com a ópera Fidelio de Beethoven.
Em 1938, obtém seu primeiro grande sucesso dirigindo Tristão e Isolda de Richard Wagner. Um crítico berlinense intitulou assim seu artigo “Das Wunder Karajan” (O Milagre Karajan). Tornava-se então um peão utilizado contra Wilhelm Furtwängler na guerra cultural que opunha Joseph Goebbels a Herman Goering pelo controle do mundo musical alemão, Goebbels sustentando a orquestra filarmônica de Karajan e Goering a Ópera Nacional.
Wikicommons
Maestro austríaco tinha uma personalidade forte que despertava controvérsia
Nazismo
Em 1939, Karajan desperta a inimizade de Hitler por ocasião de um concerto de gala em honra aos monarcas iugoslavos, quando em virtude de erro de um cantor, perde o fio de Mestres Cantores de Wagner, que regia de cor, como de hábito. Os cantores param de cantar e, em meio a maior confusão, cai a cortina. Furioso, Hitler ordena a Winifred Wagner “Enquanto eu for vivo, Herr von Karajan jamais regerá em Bayreuth”. Karajan, entretanto, permaneceu à testa da orquestra da Staatskapelle de Berlim. Em maio de 1942 foi excluído do Partido Nazista por ter desposado uma mulher que tinha um quarto de sangue judeu.
Após a guerra, em 1947, foi “desnazificado” pelos aliados. Contratado por Walter Legge, tornou-se no ano seguinte regente titular da Philharmonia Orchestra de Londres. Na reabertura do Festival de Bayreuth em 1951 foi convidado a dirigir a orquestra dio festival. Regeu um Tristão e Isolda que marcou época.
O maestro Furtwängler morre no final de 1954 e Karajan é nomeado em 1955 regente vitalício da Orquestra Filarmônica de Berlim, o que lhe permitiu realizar o seu sonho de sempre: ser o sucessor do insigne regente alemão. No comando da orquestra, já então considerada a mais prestigiosa do mundo, Karajan podia se considerar herdeiro da grande tradição alemã de direção musical – Richard Wagner, Hans von Bülow, Arthur Nikisch e Wilhelm Furtwängler. A qualidade da orquestra era tal que Karajan confiou certa feita aos seus novos músicos que “tinha a impressão de se apoiar contra um muro espesso enquanto regia”.
Em 1956, assume a direção artística do Festival de Salzburg que só deixaria em 1988. Em 1957, sucede a Karl Böhm na direção da Ópera Estatal de Viena que deixa em 1964 por desavença. De 1969 a 1971 é diretor artístico da Orquestra de Paris. Em 1977 retoma a direção da Orquestra Filarmônica de Viena como maestro convidado. No umbral dos anos 1980, Karajan desempenha um papel capital no desenvolvimento das gravações digitais e está presente na coletiva de imprensa que anunciou a criação do CD. A partir de 1982 sua relação com os músicos de Berlim são cada vez mais tensas e com frequência passa a reger em Viena.
Debilitado pela doença, demite-se em 1989 da Orquestra Filarmônica de Berlim e realiza em 24 de abril, na Deutsche Grammophon, com a Orquestra Filarmônica de Viena, sua última gravação : a Sétima Sinfonia de Bruckner.