Na semana passada, a Casa Branca se preparava para modestas comemorações, incluindo uma pequena reunião de amigos e colaboradores do presidente Barack Obama, para celebrar o primeiro aniversário de sua eleição nesta quarta-feira (4). Mas, no domingo à noite, a diretoria da CIT, a maior sociedade de crédito para estudantes dos Estados Unidos, anunciou o fechamento das operações.
A razão foi que, apesar da injeção de 2,3 bilhões de dólares, pouco depois da posse de Obama, em fevereiro, o grupo financeiro não conseguiu se manter. Fracassou assim a primeira tentativa do novo presidente de ver triunfar o pacote de ajuda aos bancos, que se transformou num dos emblemas do governo. Para o aniversário de um ano da vitória histórica do primeiro presidente negro dos EUA, o presente não podia ser pior.
Mas Obama se viu recompensado na manhã de terça-feira, quando o noticiário da CNN abriu com a notícia de que o presidente continua a ter, praticamente, a mesma popularidade de quando foi eleito. Ou seja: 54% de aprovação, um ponto percentual a mais que sua votação, como lembrou o diretor de pesquisas de televisão Keating Holland, ao apresentar os resultados da enquete.
“Em quase todas as categorias demográficas, a porcentagem dos que aprovam hoje o trabalho do presidente é a mesma que votou por ele em 4 de novembro do ano passado, com uma variação de dois ou três pontos”, detalhou Holland.
Observadores sugerem que não se pode ignorar a vertente ideológica destes resultados. Entre os chamados “liberais” – a esquerda que cada dia se sente mais próxima de Obama –, o presidente obteve mais sete pontos do que nas eleições.
Em contrapartida, o apoio entre os conservadores que votaram nele caiu 10 pontos.
O presidente obteve o resultado mesmo quando a maioria dos norte-americanos não concorda com o modo como ele enfrenta a crise econômica, os problemas na saúde pública, as guerras no Iraque e no Afeganistão, o desemprego, a imigração ilegal e o déficit do orçamento.
“Claro que são boas notícias. O povo americano, mais uma vez, mostrou confiança no presidente”, comentou o porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs.
Não, não pôde
Mas nem sempre foi assim. Obama ganhou as eleições com a célebre frase, “sim, podemos”, mas até agora não conseguiu o que disse poder fazer. Derrotados nas urnas, os republicanos ficaram desorganizados até hoje e, no início, não sabiam como reagir.
Tanto é assim que os dois meses que o presidente teve para nomear seu gabinete decorreram sem maiores incidentes, salvo a demissão de alguns dos ministros indicados (como Tom Daschell para a Saúde) porque tinham impostos atrasados.
No dia 20 de janeiro, Obama entrou na Casa Branca e, na mesma tarde, assinou os primeiros decretos presidenciais, impondo sérias regras de comportamento ético, definindo uma data para fechar a prisão em Guantánamo e o iniciando a aplicação do pacote de auxílio financeiro aos bancos e entidades de crédito. Ao mesmo tempo, lançou o pacote de ajuda às vitimas da falência das empresas de imóveis e hipotecas.
Nos primeiros meses, o Congresso – dominado pelos democratas – não fez oposição ao presidente, aprovando um a um os decretos que enviava. Obama, da mesma forma, assinava tudo o que os senadores e deputados colocavam em cima de sua mesa.
Lobby da saúde
Se alguma coisa mudou nesses dias, foi o abandono por parte de Obama do seu discurso típico de campanha, inflamado e apaixonado, por outro mais sóbrio, mais “presidencial”. Os republicanos passaram a maior parte do tempo calados, votando sempre contra suas propostas e sabendo que seus votos não valiam quase nada.
Até que, antes de junho, chegou-se ao problema da reforma da saúde e da criação de um sistema de assistência médica subsidiado pelo governo, a preços módicos, de modo a garantir a todos os norte-americanos um plano de saúde.
Dois problemas, nascidos da mesma raiz, aconteceram então: ação do poder de lobby das empresas de seguros e dos laboratórios farmacêuticos.
Isto fez com que, por um lado, muitos parlamentares democratas se recusassem a apoiar o plano do presidente. Por outro, levou os republicanos a ver o momento como a chance de ressurgir.
Extremismo
Enquanto as discussões no Congresso se arrastavam em comissões, reuniões a portas fechadas e conversas entre líderes parlamentares, os republicanos mais à direita se apoderaram da direção do partido e lançaram uma campanha contra o presidente, recorrendo a “táticas de guerrilha”, como as tentativas de “estourar” assembleias comunitárias para discutir o problema.
Foi quando Obama começou a ser abertamente acusado de “socialista”, sofreu uma campanha nacional de descrédito e insultos, e a reforma de saúde esteve prestes a ser paralisada. Ele foi acusado de negar aos norte-americanos o direito de escolher seus médicos, de promover a eutanásia com verbas públicas e de dilapidar o orçamento federal, porque sua proposta de criação do seguro alternativo envolve o gasto de 1 trilhão de dólares nos próximos 10 anos.
Eventualmente, a campanha se desfez por si só, porque os parlamentares democratas que apoiam o presidente começaram a crescer. Alguns republicanos ficaram felizes com concessões e, dentro de seu próprio partido, a racionalidade foi ganhando espaço. Segundo o presidente do Partido Republicano, Michael Steele, a tática agressiva de oposição nunca contou com seu apoio.
“O extremismo é um mau conselho para o partido neste momento. Não apoio isso, nunca dei meu apoio nem nunca o darei”, enfatizou.
Quase nada
A razão é simples, como comenta o analista Daniel Alvarez, da Universidade Internacional da Flórida. Para ele, o líder republicano “não tinha outra alternativa, porque o presidente tem muito apoio entre os norte-americanos e o seu partido [de Steele] implodiu com a vitória de Obama. Agora, sua reconstrução levará muito tempo”.
A reforma da saúde deve ser aprovada antes do fim do ano. As últimas negociações conseguiram reduzir substancialmente o seu custo, e tanto democratas quanto republicanos querem avançar rapidamente no tema.
Em termos práticos, Obama ainda não conseguiu realizar quase nada de suas promessas de campanha. Nada indica que as tropas vão sair do Iraque no seu primeiro ano na presidência; o pacote de ajuda aos bancos sofreu um grande retrocesso; ainda não há resultados à vista do plano de estímulo ao crescimento econômico, que consistiu em baixar impostos para injetar dinheiro na economia; e tudo indica que o desemprego, que no mês passado ultrapassou os 10%, continue a subir. Por fim, o dólar parece estar em queda livre nos mercados internacionais.
Apesar de tudo, Barack Obama continua a ter o apoio da maioria dos cidadãos norte-americanos. Se a popularidade será mantida, porém, é algo que depende das suas ações daqui para a frente.
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