A Corte de Cassação, terceira e última instância da Justiça italiana, confirmou nesta sexta-feira (09/07) a condenação à prisão perpetua de 14 torturadores ligados às ditaduras do Cone Sul pelo assassinato e desaparecimento de uma dezena de cidadãos italianos nas décadas de 1970 e 1980, durante a atuação da Operação Condor. Como a condenação é definitiva, não cabe mais recurso e a execução da pena é imediata.
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A Condor foi uma aliança entre Argentina, Chile, Uruguai, Paraguai, Brasil, Bolívia e Peru que permitia a troca de informações e prisioneiros e tinha como objetivo perseguir, torturar e assassinar dissidentes políticos e opositores dos regimes militares de então.
TUDO SOBRE O PROCESSO CONDOR NA ITÁLIA
Foram condenados à prisão perpétua:
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Néstor Troccoli, ex-tenente (Uruguai);
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Juan Carlos Blanco, ex-militar (Uruguai);
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José Ricardo Arab Fernández, ex-militar (Uruguai);
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Pedro Antonio Mato Narbondo, ex-militar que vive no Brasil (Uruguai);
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Juan Carlos Larcebeau, ex-militar (Uruguai);
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Ricardo José Medina Blanco, ex-militar (Uruguai);
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Ernesto Avelino Ramas Pereira, ex-militar (Uruguai);
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José Sande Lima, ex-militar (Uruguai);
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Jorge Alberto Silveira, ex-militar (Uruguai);
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Ernesto Soca, ex-militar (Uruguai);
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Gilberto Vázquez Bissio, ex-militar (Uruguai);
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Pedro Octavio Espinoza Bravo, ex-militar (Chile);
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Daniel Aguirre Mora, ex-militar (Chile);
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Carlos Luco Astroz, ex-militar (Chile).
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Os chilenos Rafael Ahumada Valderrama, Orlando Moreno Vásquez e Manuel Vásquez Chauan não haviam apresentado recurso contra a cassação e, por isso, a condenação passou a ser definitiva já em segunda instância. A íntegra da sentença da Cassação, com as motivações da Corte para a condenação dos réus, será publicada em 90 dias.
A Corte, composta por um colégio de cinco juízes, foi presidida pela juíza Maria Stefania Di Tomassi. A audiência, aberta ao público, se iniciou nesta quinta (08/07) e foi retomada nesta sexta, com leitura imediata da sentença.
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A sentença, na verdade, deveria ter sido dada ainda na quinta – no entanto, após nove horas de audiência, a Corte foi informada de que dois acusados haviam falecido – o uruguaio Luis Alfredo Maurente e o peruano Germán Ruiz Figuero. Por conta disso, e sem tempo hábil para atestar os falecimentos, os casos dos peruanos mortos durante a Operação foram desmembrados do processo principal.
Após a notificação dos falecimentos, houve um rebuliço em aula, visto a impossibilidade de haver ambos atestados de mortes por causa do fuso horário. No final da audiência a corte se retirou em câmara de conselho e decidiu desmembrar os casos de todos os peruanos porque são ligados entre si.
Janaina Cesar/Opera Mundi
Julgamento ocorreu em Roma, na Corte de Cassação
Como foi a sessão
Filippo Casa, um dos magistrados que compõem a Corte, abriu a audiência na quinta (08/07) lendo a longa relação de toda a história processual. Pietro Gaeta, procurador da Cassação, foi o primeiro a falar. Durante cerca de duas horas e meia, desconstruiu um por um os argumentos de defesa apresentados pelos advogados dos réus como, por exemplo, a falta de provas ou uso de documentos na apelação que já haviam sido depositados na primeira instância.
Após o procurador, falaram Luca Ventrella, advogado do Estado, os defensores da parte civil e os legais dos imputados. Marco Bastoni, um dos advogados de defesa dos condenados, alterou o tom da voz enquanto discursava. A juíza Di Tomassi repreendeu-o, dizendo que a Corte “não era uma feira”.
“A sentença era esperada, mas a leitura não teve a emoção que merecia depois de tantos anos de luta. Vou continuar a procurar o corpo de meu marido”, disse Cristina Mihura, cujo esposo, Bernardo Arnone, foi preso em Buenos Aires durante a ditadura militar e até hoje continua desaparecido.
Para o procurador Gaeta, “essa é uma sentença histórica. Demos às vítimas memória e justiça”. Ventrella, advogado do Estado italiano, citou o jurista Piero Calamandrei. “A justiça, como cada divindade, se manifesta para aqueles que acreditam nela. É preciso ter fé na justiça”.
Houve comoção no momento em que a juíza leu as condenações, em especial no caso de Troccoli. Ele pertencia ao comando do Serviço de Inteligência da Marinha do Uruguai (Fusna) e é acusado de ser responsável direto por mortes e torturas durante a ditadura no país (1973-1985).
Troccoli, que vive na Itália desde 2007, fugiu do Uruguai para evitar um processo em seu país. Para ele a condenação parte de imediato; para os outros, o governo italiano terá que pedir a extradição. Nove dos condenados vivem no Uruguai, três no Chile e um, no Brasil.
Sentença de réu brasileiro em outubro
Um desdobramento do processo Condor julga a participação do ex-agente da ditadura militar brasileira Áttila Rohrsetzer na prisão, desaparecimento e morte do cidadão ítalo-argentino Lorenzo Viñas, em Uruguaiana, no Brasil, em 26 de junho de 1980. O caso ainda está na primeira instância e a sentença está marcada para outubro. Julgado à revelia, se condenado, Rohrsetzer pode ter decretada a prisão perpétua.
Em 2016, quando o julgamento teve início, eram quatro réus: João Osvaldo Leivas Job, Carlos Alberto Ponzi, Marco Aurélio da Silva Reis e Áttila Rohrsetzer. Todos eram integrantes do aparato repressivo brasileiro. Como Job, Ponzi e Silva Reis morreram durante o andamento do processo, Rohrsetzer tornou-se o único processado.
Ouvida por Opera Mundi em abril, a defesa de Rohsetzer diz que as acusações são um “grave equívoco” e que o ex-agente não teve acesso aos autos do processo na Europa, além de negar que o ex-militar tenha torturado qualquer pessoa.
O processo do brasileiro corre em separado do caso principal, porque, quando a denúncia foi apresentada, o caso Condor já estava em fase de andamento e os advogados de defesa dos brasileiros alegaram que as provas e as testemunhas ouvidas até então não poderiam ser usadas retroativamente.
Prisão de Pinochet abriu brecha para denúncia
Era o fim dos anos 1990 quando Giancarlo Capaldo, promotor italiano que deu início ao caso, recebeu denúncias de parentes de desaparecidos ítalo-uruguaios e ítalo-argentinos e abriu uma investigação ligada a essas mortes no âmbito da Operação Condor. A denúncia foi feita no rastro do mandado de prisão de Augusto Pinochet emitida em 1998 pelo juiz espanhol Baltasar Garzón, que levou o ex-ditador chileno à prisão domiciliar em Londres por crimes contra a humanidade.
Após anos de investigação que envolveu vários países e colaboradores, Capaldo pretendia levar para o banco dos réus todos os 140 denunciados, mas, devido às mortes de alguns deles durante o caso e inúmeros problemas burocráticos com alguns países, o número de acusados foi reduzido e somente 33 foram levados ao banco dos réus.
O caso teve início em 2015 e se encerrou nesta sexta, 9 de julho.
Este é o primeiro processo na Europa a reconhecer a existência da Operação Condor e a condenar os responsáveis por crimes cometidos durante os anos de atuação da operação.